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A (i)licitude da greve ao trabalho suplementar?

By 4 Setembro, 2023Setembro 14th, 2023No Comments

Por conta de um passado com grandes restrições no direito à greve, a Constituição da República Portuguesa, limita-se intencionalmente, a não atribuir um conceito de greve por considerar que qualquer definição seria redutora e poderia conduzir uma limitação a este direito fundamental.

Neste contexto, o n.º 2 do art.57º da CRP define que “compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito”.

Decorrente da ausência de definição do conceito de greve por parte do legislador, a doutrina defende o direito à greve enquanto abstenção concertada da prestação de trabalho, por um grupo de trabalhadores, como meio de realizar objetivos comuns.

Assim, tal como qualquer outro direito fundamental, o direito à greve não é absoluto e deve conciliar com os demais direitos constitucionais previstos, portanto nem toda e qualquer forma de luta dos trabalhadores deve ser qualificada como greve. 

Neste contexto, parte da doutrina e da jurisprudência qualifica a greve ao trabalho suplementar ou às horas extras enquanto greve em sentido impróprio, isto é, a abstenção seletiva de alguns deveres contratuais que conduz a grande prejuízo do empregador e eliminação dos custos ao trabalhador e a associação sindical.

O trabalho suplementar é definido pelo art.226º/1 CT enquanto “trabalho prestado fora do horário de trabalho”, portantoserá suplementar a atividade realizada antes do início da jornada, depois do fim da jornada de trabalho, nos dias de descanso semanal ou feriados.

O empregador poderá solicitar a prestação de trabalho suplementar, de acordo com o art.227º/1 CT, quando seja necessário fazer face a acréscimo eventual e transitório de trabalho e não se justifique para tal a admissão de trabalhador, para tal deve observar os limites de horas previstos no art.228º CT.

Ainda, poderá solicitar a prestação de trabalho suplementar em circunstâncias de força maior ou quando seja indispensável para prevenir ou reparar prejuízo grave para a empresa ou para a sua viabilidade, de acordo com o art.227º/2 CT, sem qualquer limite de horário.

O trabalhador é obrigado a prestar trabalho suplementar quando verificados estes requisitos, exceto quando expressamente solicite a sua dispensa, nos termos do art.227º/3 CT. No entanto, caso não respeite os pressupostos do art.227º CT a ordem do empregador é ilícita e o trabalhador poderá recusar-se a cumprir a ordem do empregador.

Aqui chegados, devido ao carácter excecional e urgente do trabalho suplementar parte da doutrina não admite a greve ao trabalho suplementar, na medida em que o trabalhador está a recusar um dever contratual quando o empregador mais o necessita. 

Por outro lado, outra parte da doutrina, considera que devido à amplitude atribuída ao direito à greve pela CRP, deve ser admitida esta modalidade. Ainda assim, a greve ao trabalho suplementar ilícito é admita por toda a doutrina e jurisprudência.

Posto isto, a licitude da greve trabalho suplementar é uma questão controvertida na doutrina e na jurisprudência e urge um tratamento unitário e equilibrado face a todos os interesses em causa.

Ana Catharina Souza @ DCM | Littler