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Será que a diferença de localização geográfica da sede da sociedade dominante é fundamento material suficiente para determinar e legitimar um nível distinto de proteção dos créditos dos trabalhadores emergentes de uma relação de trabalho ou da sua ruptura?
Esta foi a questão apreciada pelo Tribunal Constitucional (TC) no seu recente acórdão n.º 227/2015. Neste processo estava em causa a alegada inconstitucionalidade da interpretação conjugada dos artigos 334.º do Código do Trabalho e 481.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais, na parte em que impedem a responsabilidade solidária de sociedades em relação de domínio ou grupo com sede fora do território nacional. No caso dos autos, perante a insolvência do seu empregador, um trabalhador procurou fazer valer os seus créditos perante a sociedade de direito alemão que detinha quase a totalidade das suas participações sociais.
O TC entendeu que afastar a responsabilidade de uma sociedade em função da localização da sua sede é violador do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP, tendo declarado a sua inconstitucionalidade.
À luz do direito interno, a solução encontrada pelo TC evidencia uma natural preocupação quanto à existência de um regime diferenciado dos créditos de um trabalhador. Convém relembrar que estamos perante trabalho prestado em Portugal para uma sociedade portuguesa, mas cujas participações são detidas por uma sociedade de direito alemão. Este último facto reduz a tutela dos direitos do trabalhador, daí o sentido do acórdão.
Porém, podem ser levantadas algumas dúvidas sobre esta decisão, tendo nomeadamente presente o teor dos votos de vencido. Com efeito, o alargamento da responsabilidade solidária a sociedades estrangeiras constituirá, de facto, uma solução admissível com fundamento no princípio da igualdade?
Ora, a diferenciação parece ser intencional no sentido de promover o investimento estrangeiro em Portugal. Ao contrário do que sucede noutras latitudes, a economia nacional depende, em larga medida, do investimento estrangeiro para reduzir a dependência de dívida. Não queremos, no entanto, afirmar que a questão em apreço seja a pedra-de-toque na decisão de investimento; contudo, esta jurisprudência constitucional, a manter-se, pode constituir um estímulo negativo para os investidores institucionais estrangeiros.
Considerando que não há emprego sem empresas, não seria este um interesse digno de tutela?

Mais, no “concurso de normas” europeu, outros Estados-membros podem tirar partido desta restrição. Não será a falta de harmonização deste tema uma omissão intencional por parte do legislador comunitário?
Nota 1: publicado no Jornal OJE no dia 4.6.2015
Nota 2: em co-autoria com Duarte Abrunhosa e Sousa