A legislação laboral vive num clima de mudança permanente desde há cerca de 3 anos. Não surpreende, por isso, que na passada sexta-feira tenha sido publicado um novo diploma com relevância para a vida das empresas.
As convenções coletivas de trabalho (CCT) assumem a seguinte tipologia: (i) contrato coletivo de trabalho: convenção celebrada entre associação sindical e associação de empregadores; (ii) acordo coletivo de trabalho: convenção celebrada entre associação sindical e uma pluralidade de empregadores para diferentes empresas; e (iii) acordo de empresa: convenção celebrada entre associação sindical e um empregador para uma empresa ou estabelecimento.
A CCT obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associação de empregadores celebrante, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros de associação sindical celebrante (princípio da filiação). A CCT pode ser, ainda, aplicável quando o trabalhador não filiado em associação sindical escolha a CCT aplicável na empresa ou quando seja emitida uma portaria de extensão.
A portaria de extensão visa alargar o âmbito de aplicação de uma CCT ao setor de atividade ou ao setor profissional e deve ter em conta as circunstâncias sociais e económicas que a justifique, nomeadamente a identidade ou semelhança económica e social das situações no âmbito da extensão e da CCT a que se refere. A competência para a emissão da portaria de extensão cabe ao ministro responsável pela área laboral e, em caso de oposição por motivos económicos, cabe também ao ministro responsável pelo sector de atividade.
Em Outubro de 2012, no cumprimento de uma obrigação assumida no Memorando da Troika, o Governo definiu “critérios mínimos, necessários e cumulativos a observar no procedimento para a emissão de portaria de extensão”. No essencial, o Governo auto vinculou-se a emitir portarias de extensão quando estivesse verificado um exigente critério de representatividade (a parte empregadora subscritora da CCT devia ter ao seu serviço, pelo menos, 50% dos trabalhadores do setor de atividade, no âmbito geográfico, pessoal e profissional de aplicação pretendido) com o objetivo de reduzir as portarias de extensão, relegando a negociação das condições de trabalho para o nível da empresa e maximizando, nesse aspeto, o papel do contrato de trabalho. O que veio a acontecer.
Com efeito, de acordo com o “Relatório Anual da Negociação Coletiva” da UGT, foram publicadas em 2010 116 portarias de extensão; e em 2013 apenas 9 portarias de extensão de CCT de 2011 e 2012, deixando de fora o alargamento das condições de trabalho de CCT publicadas nesse ano. Na ausência de portarias de extensão, verificou-se, naturalmente, a redução do número de trabalhadores abrangidos por CCT.
Ora, no passado dia 27 de junho, o Governo procurou flexibilizar as condições de emissão de novas portarias de extensão, através de um critério adicional: a parte empregadora subscritora da CCT deve ter um conjunto de associados constituído, pelo menos, por 30% de micro, pequenas e médias empresas, isto é, empresas que empreguem até 250 trabalhadores. Embora nos reportemos a dados do ano 2000, este critério pode representar 91% das empresas em Portugal. Dito de outro modo, as empresas com 250 ou mais trabalhadores não representavam, em 2000, sequer 1% das empresas, embora tivessem ao seu serviço cerca de 31% dos trabalhadores.
Em suma, esta medida pode levar a uma melhoria das condições de trabalho (em especial, dos salários) por força da negociação coletiva, escapando à vontade do empregador ou a critérios de produtividade.
Todavia, estão na “linha de montagem” dois diplomas que podem “recalibrar” o regresso ao “alargamento compulsivo” de CCT: a redução da sobrevigência e a possibilidade de suspensão da CCT em caso de crise da empresa (referidos no nosso artigo da passada semana).
Resta-nos aguardar pelos efeitos destas alterações normativas.
Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 1.7.2014.
Sobre esta questão vide:
– Professor Doutor Pedro Silva Martins (Professor no Queen Mary College, Universidade de Londres, ex-Secretário de Estado do Emprego 2011-2013): aqui e aqui