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As práticas anticoncorrenciais e o mercado laboral

By 12 Fevereiro, 2024No Comments

Uma das entidades reguladoras portuguesas, não quis deixar passar em branco o infinito mês de janeiro, pelo que decidiu emitir o Comunicado 04/2023, de 25 de janeiro de 2024, relativo às práticas anticoncorrenciais no mercado laboral.

Assim, numa tentativa de retomar o tema já anteriormente abordado, esta entidade reguladora voltou a sancionar as práticas anticoncorrenciais no mercado de trabalho, estando em causa, desta vez, duas multinacionais da área da consultoria tecnológica, que optaram desde logo por colaborar com aquela, procedendo ao pagamento voluntário da coima.

Estas práticas anticoncorrenciais, traduzidas em acordos de não-contratação (ou “no-poach”), consistem em acordos celebrados entre dois ou mais empregadores, onde os mesmos se comprometem a não recrutar nem a efetuar propostas espontâneas aos trabalhadores das empresas partes do acordo.

Tais práticas, por limitarem a autonomia das empresas na definição de condições comerciais estratégicas, designadamente quanto à política de contratação de recursos humanos, são proibidas à luz da Lei da Concorrência (Lei n.º 19/2012, de 08 de maio).

Já em  2021, esta entidade reguladora, numa tentativa de prevenção das referidas práticas, decidiu publicar um Relatório e Guia de Boas Práticas de modo a mostrar a necessidade de alertar as empresas a adotar, a nível interno, condutas conformes à concorrência do mercado laboral, nomeadamente através da sensibilização dos trabalhadores e profissionais de recursos humanos recorrendo a formação interna.

Contudo, tais práticas têm também relevo a nível laboral, na medida em que são suscetíveis de afetar o poder negocial e a mobilidade laboral dos trabalhadores, algo que já se encontra salvaguardado pelo próprio art. 138.º do Código do Trabalho (“CT”), ao estipular que é nulo o acordo entre empregadores, nomeadamente em cláusula de contrato de utilização de trabalho temporário, que proíba a admissão de trabalhador que a eles preste ou tenha prestado trabalho, bem como obrigue, em caso de admissão, ao pagamento de uma admissão.

O que nos leva a questionar a aplicabilidade prática do mesmo, uma vez que, e em título de lembrete, esta é já a segunda intervenção desta entidade nesta matéria (sendo que a primeira vez ocorreu no ano de 2022, nomeadamente no mercado laboral desportivo), sem nunca ter referido a existência de tal artigo. Tal pode-se dar pelo facto de o art. 138.º do CT não acarretar, por si só, qualquer tipo de sanção, prevendo apenas a nulidade de tais cláusulas.

Ora, questiona-se se não deveria haver espaço para a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) intervir neste âmbito, maxime em conjunto com as entidades reguladoras? Será a proibição estipulada pela Lei da Concorrência suficiente para assegurar tal prevenção?

Parece-nos que tal poderá ser algo a considerar, atendendo à recente evolução da matéria e à emergência de cada vez mais casos e decisões que interligam o Direito do Trabalho com o mercado concorrencial.

Marta Coelho Valente @ DCM | Littler