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Até que um website nos separe?

Em recente decisão do TEDH, caso Herbai vs. Hungria, discute-se a liberdade de expressão de um trabalhador, conforme art. 10.º da CEDH, face a interesses económicos do empregador.

O trabalhador Herbai, cidadão húngaro, trabalhava num Banco como gestor de recursos humanos desde 2006. Em janeiro de 2011, Herbai, iniciou com uma colega de profissão um website de partilha de informações e eventos sobre gestão de recursos humanos, onde foram publicando artigos. Houve, no entanto, dois artigos (1. New year, new strategy – Really new? Really a strategy?” escrito pela colega sobre novas políticas salariais, e 2. “Sweet 16%” escrito pelo trabalhador sobre recente reforma fiscal que afetava os gestores de recursos humanos) que, embora sendo de carácter genérico, e sem particularizar informação ou qualquer referência ao empregador, serviram de fundamento ao despedimento por violação de dever de sigilo. O banco despediu Herbai, em fevereiro de 2011, por quebra do dever de sigilo. Segundo a sua perspetiva, a prestação de informação de natureza genérica sobre os recursos humanos ofendia os seus interesses económicos, na medida em que o Banco tinha procedido a uma reforma salarial recentemente e o trabalhador, através da posição que ocupava no Banco, obteria informações que, ao serem partilhadas, poderiam contender com interesses deste.

O trabalhador intentou uma ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento que não obteve vencimento. Recorreu ao tribunal de segunda instância que entendeu que, por não ter partilhado informação particularizada, por ser esta de natureza genérica, não prejudicava, nem violava o dever de sigilo e, por isso, o despedimento seria ilícito. No entanto, em recurso para o Supremo, este entendeu que bastava a partilha de informação de natureza profissional para caracterizar motivo de despedimento. O trabalhador queixou-se ao tribunal constitucional húngaro que concluiu não estar o artigo coberto pelo direito à liberdade de expressão por não ter conteúdo político, tendo assim rejeitado a queixa. Desta feita recorreu para o TEDH, que admitiu o recurso, levando a conhecimento a violação do seu direito à liberdade de expressão, consagrado no art. 10.º da CEDH.

Segundo este Tribunal não houve qualquer afetação do banco ou da área de negócios pelos artigos publicados no website onde o trabalhador participava. Concluiu que o direito à liberdade de expressão deve ser assegurado nas relações trabalhador-empregador, e que os tribunais húngaros não realizaram qualquer ponderação equilibrada face aos interesses em presença, considerando a sanção de despedimento aplicada excessiva. Assim, decidiu, por unanimidade, que houve violação o direito à liberdade de expressão do trabalhador.

Caberá refletir sobre o alcance do seguinte desafio: constituirá um exercício ilegítimo da liberdade de expressão – e de criação – por contender com interesses económicos do empregador, a elaboração de artigos sobre a área de estudo do trabalhador, a qual é também profissional, alertando para reformas, eventos ou alterações relevantes?

 

David Carvalho Martins | Ana Amaro | DCM LAWYERS