A 17 de abril de 2023 veio o Tribunal da Relação do Porto emitir uma decisão sobre a presunção de aceitação de despedimento que se afigura relevante, nomeadamente para efeitos do cálculo da compensação devida ao trabalhador.
O litígio em apreço opõe uma Trabalhadora, com a categoria profissional de técnica superior, e uma Escola Profissional, por sua vez Entidade Empregadora daquela.
Em resumo, entre ambas as partes terão sido celebrados dois contratos: i) um contrato de trabalho por termo indeterminado, no âmbito do qual foi acordada uma retribuição mensal de 1.200,00€; ii) e um contrato em comissão de serviço, no âmbito do qual foi acordado pagar à Trabalhadora uma retribuição adicional, no valor de 500,00€.
Desta forma, torna-se a questão essencial saber se o montante de retribuição a ter em consideração para efeitos do cálculo da compensação devida por extinção do posto de trabalho seria o correspondente a 1.200,00€ ou a 1.700,00€ (ou seja, correspondente à soma de ambas as retribuições).
Vem, em primeiro lugar, o Tribunal da Relação do Porto afirmar que as duas posições contratuais em simultâneo – contrato de trabalho por tempo indeterminado (para umas funções) e em comissão de serviço (para outras funções) não são incompatíveis.
A comissão de serviço, sendo um regime especial de contratação face ao regime geral, permite a ocupação através de nomeações transitórias para cargos de Administração ou equivalente , de direção ou chefia diretamente dependente da administração ou de diretor-geral ou equivalente, funções de secretariado pessoal de titular de qualquer desses cargos, ou ainda, desde que instrumento de regulamentação coletiva de trabalho o preveja, funções cuja natureza suponha especial relação de confiança em relação a titular daqueles cargos e funções de chefia, sendo prática a atribuição de um valor superior por tais funções.
Para efeitos de despedimento ilícito, diz-nos o art.º 366.º n.º 4 CT que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a totalidade do valor da compensação prevista neste artigo. Nesta senda, se o empregador tiver calculado a compensação tendo em conta o valor de 1.200,00€ – que foi o que aconteceu – e devesse ter tido em consideração o acréscimo de 500,00€ devido pelo contrato de comissão de serviço, então a estatuição deste artigo não se daria como preenchida, uma vez que a presunção de aceitação de despedimento apenas atua quando o empregador tiver pago a totalidade da compensação.
O Tribunal de Relação do Porto, contrariamente ao anteriormente decidido pela primeira instância, vem dar resposta a esta questão e decide no sentido de que a compensação oferecida pela Entidade Empregadora não foi inferior à legalmente devida, afirmando que “no cômputo da compensação devida no despedimento por extinção do posto de trabalho, haverá que considerar apenas a retribuição correspondente ao trabalho por tempo indeterminado, não incluindo o valor da retribuição paga pela comissão de serviço, face ao que a Lei prevê na sua cessação.” Isto é, ainda que ambos os contratos sejam compatíveis, para efeitos da compensação vem apenas considerar o contrato de trabalho por tempo indeterminado.
Assim, apesar do direito à compensação estabelecido no art. 164.º n.º 1 al. c), esta reporta-se à cessação do contrato em comissão de serviço. Uma vez que no litígio subjacente esta é relativa ao despedimento por extinção do posto de trabalho, então os 500,00€ acrescidos não foram tidos em conta, valendo, para efeitos de cálculo da compensação, apenas o valor de 1.200,00€, considerando-se o despedimento aceite pela Trabalhadora, para efeitos de aplicação do art. 366º n.º 4 CT, dado que inexistia qualquer valor em falta para efeitos de ilicitude do despedimento.
Será a solução dada pelo Tribunal excessivamente onerosa para a Trabalhadora? A decisão não é isenta de dúvidas, pelo que nos manteremos atentos a futuras decisões jurisprudenciais relativas a esta matéria.
Joana Azenha e Filipa Grilo @ DCM | Littler