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Despedimentos em tempos de crise

Será que o “layoff simplificado” vai reduzir ou limitar os despedimentos em tempos de crise?

Numa situação de travagem a fundo da economia que exige a redução dos custos ou a adaptação da estrutura organizativa às solicitações do mercado, os empregadores podem evitar os despedimentos porque, por exemplo, (i) pretendem salvaguardar a manutenção das equipas – e do know-how – para o período pós-crise, (ii) não têm o tempo ou os recursos necessários para observar um procedimento de despedimento coletivo ou de extinção de posto de trabalho (v.g. o pagamento das compensações e dos créditos salariais constitui requisito essencial da validade destes despedimentos) ou (iii) dispõem de mecanismos alternativos que reduzam custos ou preservem alguma estabilidade financeira, desde que sejam céleres, efetivos e eficientes.

É, precisamente, neste ponto que urge criar um “layoff simplificado” que seja uma alternativa real aos despedimentos ou, no limite, às insolvências.

Este “layoff simplificado” foi referido, pela primeira vez, na Resolução do Conselho de Ministros n.º 10-A/2020, e viu (parcialmente) a luz do dia com a Portaria n.º 71-A/2020, mas deverá continuar a ser aperfeiçoado nas próximas semanas.

Diga-se, em abono da verdade, que a Portaria n.º 71-A/2020, na versão vigente no momento em que escrevemos, não criou qualquer “layoff”, porque não justificava, nem podia permitir, por si só, qualquer redução do período normal de trabalho ou suspensão do contrato de trabalho por motivo de crise empresarial. Por outro lado, não era “simplificado”, porque fez emergiu um mar de questões e de dúvidas, inimigas da certeza e da segurança jurídicas.

As alterações que foram divulgadas pela comunicação social, mas que não estão ainda publicadas, deixam antever a necessidade de ajustamentos adicionais. Tomamos a liberdade de sugerir, por exemplo, os seguintes:

a) Aproximar – e, por conseguinte, alargar – o conceito de crise empresarial ao previsto no Código do Trabalho: “motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras ocorrências que tenham afetado gravemente a atividade normal da empresa, desde que tal medida seja indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de trabalho”;

b) Prever um catálogo exemplificativo de situações de crise empresarial que facilite o início do procedimento e a sua verificação pelas autoridades competentes;

c) Antecipar os reembolsos da Segurança Social relativamente à compensação retributiva que deve ser paga mensalmente pelo empregador ou, em alternativa, prever o pagamento direto dessa parcela pela Segurança Social aos trabalhadores abrangidos;

d) Substituir a proibição dos despedimentos pelo pagamento de um incentivo à manutenção dos contratos de trabalho após a crise.

A regra da proibição dos despedimentos existe no “layoff clássico” e não nos surpreende que seja explicitada no “layoff simplificado”. Contudo, tem um alcance muito limitado.

Esta proibição, aparentemente, cobre apenas os despedimentos coletivos ou por extinção de posto de trabalho. Por outras palavras, deixa de fora a cessação da comissão de serviço, a caducidade do contrato de trabalho a termo ou temporário ou a cessação do contrato de trabalho durante o período experimental. Dir-se-á: proíba-se!

Ainda que tal fosse possível, ficavam de fora os denominados despedimentos negociados, isto é, os acordos de revogação do contrato de trabalho, com ou sem acesso ao subsídio de desemprego. Reiterar-se-á: proíba-se também! Essa solução, de extremo paternalismo, teria muitos problemas de constitucionalidade, porque eliminaria a liberdade que cada um deve ter para decidir o seu futuro. Por outro lado, um subsídio de desemprego poderá conferir uma proteção superior ao regime do “layoff” para o trabalhador.

Admitamos, por hipótese, uma intervenção mais extrema ou severa: tudo proibido, não há qualquer tipo de cessação do contrato de trabalho durante a crise! Essa solução amarrará todos os trabalhadores ao “Titanic” em que se converteria cada empresa, rumo ao fundo do Oceano, isto é, à insolvência, a qual, creio, não poderá ser também proibida.

A colocação de tinta preta em folha branca não altera a natureza das coisas, ou seja, por decreto, não se coloca uma pessoa em Júpiter.

Nesta matéria, cabe observar a seguinte diretriz: “É proibido proibir!”.

David Carvalho Martins | DCM LAWYERS para o Dinheiro Vivo