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Insolvente – Ação pendente: E agora?

By 29 Janeiro, 2024No Comments

As relações de grupo e domínio entre empresas parecem invadir o quotidiano laboral. Neste sentido, levantam-se várias questões de relevante reflexão, nomeadamente, da repercussão dessas relações de grupo e domínio nas relações laborais. Neste sentido, se colocou a questão de saber se certa entidade empregadora ficar insolvente, poderá prosseguir-se com a ação (pendente) junto de empresa em relação de domínio com a empregadora? Ora, esta foi, em resumo, a pergunta a que o Tribunal da Relação de Lisboa respondeu no processo n.º 23417/20.0T8LSB-A.L1-4.

O caso em apreço dizia respeito a um trabalhador que ao impugnar o despedimento que considerava ser ilícito, deparou-se, após a fase dos articulados, com a situação da sua entidade empregadora ter sido declarada insolvente. Ademais, foi admitia a intervenção principal, enquanto Ré, de uma empresa, até então terceira, com o qual a empregadora se encontrava numa relação de domínio.

Na senda declaração de insolvência, foi proferido despacho na ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento a decidir pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

A Ré-interveniente invocou que o trabalhador teria de reclamar o crédito no processo de insolvência, por outro lado, o Autor invocou o artigo 334.º do Código do Trabalho (doravante CT), para efeitos da responsabilidade solidária entre empregador e sociedade que com este se encontre em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos artigos 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais.

A análise do artigo 334.º do CT permitir-nos-á encontrar o caminho seguido pelo douto Tribunal para fundamentar a decisão.

Nestes termos, para que possa existir responsabilidade solidária pelo pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação é necessário que, cumulativamente, se verifique (i) uma relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo entre o empregador e outra ou outras sociedades e (ii) tratar-se de créditos vencidos há mais de três meses.

Neste seguimento o artigo 334.º do Código do Trabalho, na convergência entre o mesmo e o disposto no supramencionado artigo 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais, assumem uma função creditícia garantística. Sem prejuízo do antes referido, e tal como aconteceu no caso em análise, o trabalhador tem o ónus de alegar e provar, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, por ser facto constitutivo do direito que invoca, a existência das sociedades que se encontram entre si numa situação de participação recíproca, de domínio ou de grupo.

Ora, também nesta senda, se afigura relevante trazer à colação o dever de informação plasmado no artigo 106.º, n.º 3, alínea a) do Código do Trabalho – onde – o empregador deve prestar ao trabalhador informação relativa à identificação, nomeadamente, sendo sociedade, a existência de uma relação de coligação societária, de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, bem como a sede ou domicílio. O cumprimento deste dever de informação assinala-se de suma importância para situações como a dos autos.

Em conclusão o douto Tribunal decidiu que a ação prosseguisse os seus termos entre as partes remanescentes (Autor e Ré-interveniente), uma vez que a empregadora (antes de ser declarada insolvente) se havia pronunciado em articulado próprio sobre as razões de facto e direito da ação, considerando-se já produzido o substancial da prova relevante para a boa decisão da causa.

Nesta senda, o sumário do acórdão assume relevância para uma proposta de resposta à questão colocada no nosso título (onde não se podem olvidar os contornos do caso concreto):

A insolvência da sociedade empregadora decretada após a fase dos articulados não afasta a possibilidade de na ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento ser efetuada a responsabilidade pelos créditos laborais de uma sociedade, terceira interveniente, que com ela estava numa relação de domínio, devendo a ação prosseguir seus termos apenas entre o apelante autor trabalhador e essa apelada sociedade terceira interveniente.”.

Assim, verifica-se, novamente, que os deveres de informação emergentes da relação laboral, de parte a parte, revelam-se (sempre) de singular relevância.

Continuaremos atentos!

Ana Amaro | DCM | Littler