No passado dia 17 de maio foi proferido um acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça respeitante à cláusula 82.ª do Contrato Coletivo entre a Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal – AIMMAP e o SINDEL – Sindicato Nacional da Indústria e da Energia, no que concerne a faltas por motivo de falecimento de parentes. Mas, afinal, como se interpreta uma cláusula que dispõe que um determinado trabalhador pode faltar, justificadamente, Até cinco dias consecutivos por falecimento de cônjuge (…) e, também, Até dois dias consecutivos por falecimento de outro parente ou afim na linha recta ou em 2.º grau da linha colateral (…)?
Depois de uma decisão de 1ª instância a propugnar por uma interpretação onde a referência a “dias consecutivos” deve ser interpretada no sentido de serem dias seguidos de calendário, independentemente de serem dias de trabalho, feriados ou dias de descanso e um recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por outro lado, e ainda que com um voto de vencido, entendeu que esta expressão se refere a dias consecutivos de falta ao trabalho e não a dias seguidos de calendário, com o fundamento de combate a uma possível discriminação, o que é que se concluiu?
Aquando da interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho, enquanto se atribui uma importância acrescida ao elemento literal, nunca se pode descurar a globalidade do diploma legal onde a cláusula se insere. Se atentarmos outras cláusulas da CCT em causa, são utilizadas outras expressões que, de forma clara, diferenciam as várias situações como “dias úteis” (Cláusula 38.ª, n.º 3), “dias seguidos” (Cláusula 81.ª, n.º 2, alínea a)), “dias consecutivos” (Cláusula 82.ª) e “dias úteis consecutivos” (Cláusulas 72.ª, alínea d) e 73.ª, n.º 6). Ora, e como bem entende o STJ, interpretar como “dias consecutivas” em correlação direta com o conceito de “falta” é, no mínimo, redutor.
E, subvertendo o conceito de discriminação, e de forma genial, sendo este CCT aplicável a uma multiplicidade de relações laborais, incluindo aquelas que integram trabalhadores que exerçam a sua atividade laboral aos fins-de-semana, interpretar os dias de faltas “consecutivos” como sendo dias úteis determinaria, poderia sim constituir uma forma de discriminação entre trabalhadores no sentido de que os que gozassem o seu descanso aos fins-de-semana seriam beneficiados relativamente aos demais.
Manter-nos-emos atentos a mais decisões que nos permitam interpretar, de forma mais profícua, os instrumentos legais vigentes no nosso ordenamento jurídico.
Maria Beatriz Silva @ DCM | Littler