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Metadados: uma questão de inconstitucionalidade

By 12 Maio, 2022No Comments

Catorze anos após a entrada em vigor da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, a conhecida “Lei dos Metadados”, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2006/24/CE, de 15 de março de 2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, suscitam-se questões da conformidade deste normativo com a lei fundamental portuguesa, por violação de diversos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Mas o que é isso dos Metadados? São dados que permitem um rastreamento muito mais pormenorizado de certa informação, p.e., a localização e a identidade dos interlocutores numa chamada telefónica ou numa mensagem; no caso dos computadores (ou qualquer dispositivo eletrónico que consiga aceder à internet), podem verificar as horas de entrada e saída, a localização e duração dos acessos a determinado website ou qualquer operação online ou o próprio endereço IP (um número particular a cada dispositivo). Os Metadados excluem, todavia, o conteúdo das chamadas, particularmente o que é dito.

Por representarem dados de tráfego e localização das comunicações das pessoas, suscetível de identificar um determinado sujeito num determinado momento, podendo, inclusive, traduzir dados da vida privada, as normas  da “Lei dos Metadados” que determinam a conservação dos dados de tráfego e localização das comunicações pelo período de um ano (arts. 4.º e 6.º), bem como a norma que previa a não comunicação ao visado que os seus dados haviam sido acedidos para efeitos de investigação criminal (art. 9.º), foram declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral, no recente Acórdão do Tribunal Constitucional.

Entenderam os Juízes do Palácio Ratton que guardar os dados de tráfego e localização das pessoas, de uma forma generalizada, restringe de modo desproporcionado o conteúdo do direito de reserva da intimidade da vida privada das pessoas, do sigilo das comunicações e da autodeterminação informativa.

Muito já se havia especulado sobre uma possível decisão deste teor, dada a declaração de invalidade da Diretiva 2006/24/CE, de 15 de março de 2006, pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em 2014, e os reflexos inconstitucionais que esta transposição apresentava no instrumento nacional.

Será esta intrusão nos dados das pessoas – dados esses de tráfego e não de conteúdo – uma flagrante violação do direito à privacidade ou ao sigilo previsto na Constituição da República Portuguesa enquanto direito fundamental?

Poderão os prazos de conservação destes dados ser encurtados para obviar a uma inconstitucionalidade, garantindo-se ao mesmo tempo a salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos?

Que efeitos acarretará a decisão do Tribunal Constitucional nas condenações já proferidas e nos processos ainda em curso?

Estará aberta a porta a uma nova revisão constitucional?

Gonçalo Asper Caro @ DCM | Littler