No passado dia 5 de junho, o Governo apresentou na Assembleia da República duas novas propostas de alteração das leis do trabalho, as quais se encontram em fase de apreciação pública até ao próximo dia 27 de junho.
A primeira medida cuida dos seguintes aspetos: (i) a suspensão do período de negociação da convenção coletiva de trabalho; (ii) a redução dos prazos de sobrevigência e caducidade da convenção coletiva de trabalho; e (iii) a possibilidade de suspensão, total ou parcial, da convenção coletiva de trabalho, por acordo entre o empregador e as associações sindicais outorgantes em situação de crise empresarial, por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras ocorrências que tenham afetado gravemente a atividade normal da empresa e essa medida seja indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de trabalho.
Devemos referir que a sobrevigência reduz (substancialmente) os efeitos da caducidade de uma convenção coletiva de trabalho, visto que esta continua a produzir efeitos jurídicos após o seu termo para permitir a sua revisão ou substituição sem quebra das condições de trabalho.
As convenções coletivas de trabalho têm assumido uma vocação de perenidade e reforçam a, proclamada, rigidez do regime laboral português. A proposta de lei em apreço pretende diminuir a força vinculativa destes instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, através da redução do período de sobrevigência e da sua suspensão total ou parcial em situação de crise empresarial.
A segunda medida visa prolongar, até 31 de dezembro de 2014, a suspensão das disposições de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho (v.g., contratos coletivos de trabalho ou acordos de empresa) e das cláusulas de contratos de trabalho, que tenham entrado em vigor antes de 1 de agosto de 2012 e que disponham sobre (i) os acréscimos remuneratórios devidos por trabalho suplementar superiores aos previstos no Código do Trabalho e sobre (ii) a retribuição do trabalho normal prestado em dia feriado, ou descanso compensatório por essa mesma prestação, em empresa não obrigada a suspender o funcionamento nesse dia.
Numa primeira e perfunctória análise, diríamos que a medida mais inovadora se prende com a suspensão, total ou parcial, de convenções coletivas de trabalho em situação de crise empresarial.
De referir que não se trata de uma solução revolucionária se atendermos a experiências de outros países. Admitimos, aliás, que o legislador tenha buscado inspiração no “procedimento de descuelgue” que vigora em Espanha, o qual consiste num mecanismo extraordinário que permite não aplicar as condições de trabalho previstas em convenções coletivas de trabalho, quando a empresa se encontre numa situação económica difícil. Desde a Reforma de 2012, para além do regime salarial, a possibilidade de não aplicação de uma convenção colectiva de trabalho passou a abranger também as matérias dos tempos de trabalho e da definição das funções atribuídas aos trabalhadores.
Em suma, estas medidas visam transformar as convenções coletivas de trabalho em instrumentos de adaptabilidade da legislação laboral às necessidades das empresas e dos setores de atividade. Cumpre aguardar pelo debate durante o período de apreciação pública e pelos seus resultados.
Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 19.6.2014.