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O conceito de trabalhador e trabalho 4.0 na UE

O tema que envolve o conceito de trabalhador tem sido um dos focos principais do TJUE, existindo sólida jurisprudência na densificação de um conceito expansivo à luz dos Tratados Constitutivos, bem como dos vários Regulamentos e Diretivas aplicáveis. A Era Digital, do trabalho automatizado, em contexto de Big Data, em plataformas digitais e de smartworking, tem dominado os temas da atualidade um pouco por todo o mundo.

Recentemente, em Espanha, havia sido decidido (cfr. Juzgado de lo Social n.º2 de Zaragoza) que os “riders” configurariam um tipo de falsos trabalhadores autónomos, não obstante a sua flexibilidade, seria o beneficiário da atividade (empresário) quem mantinha a prestação dos serviços por forma organizada, regendo os “revendedores” e mantendo fortes índices de subordinação – e, por essa razão, a empresa não se limitava a contratar os trabalhadores para um serviço de transporte e entrega de comida.

Mais recentemente e forma algo surpreendente, algumas associações de “riders” enviaram uma carta ao Ministério do Trabalho de Espanha a solicitar a manutenção do estatuto de autónomos.

Neste contexto de indefinição, o TJUE veio negar a qualificação de natureza laboral para efeitos de aplicação da Diretiva 2003/88/CE, relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho (cfr. Ac. do TJUE de 22.04.2020, proc. C-692/19), tendo por base um pedido prejudicial do Tribunal do Trabalho de Watford (cfr. Pedido Prejudicial de 19.09.2019, B v. Yodel Delivery Network Ltd, Proc. C-692/19). Na sua argumentação, destacam-se alguns pontos essenciais: (i) o facto de os “riders” estarem na disponibilidade de realizar subcontratações ou contratar substitutos para efetuarem o serviço; (ii) a possibilidade de os “riders” aceitarem ou recusarem as diferentes tarefas apresentadas pelo “putativo empregador”; (iii) a liberdade que aqueles prestadores dispõem para estabelecer unilateralmente o seu número máximo de tarefas; (iv) a liberdade de proporcionar os seus serviços a terceiros, incluindo agentes de mercado concorrentes do “putativo empregador”; e, ainda (v) o facto de os prestadores fixarem as suas horas de trabalho, dentro de certos parâmetros, organizando dessa forma o seu tempo e a sua vida pessoal, não tendo exclusivamente em conta o interesse do “putativo empregador”. Posto isto, concluiu o TJUE que: “provided that, first, the independence of that person does not appear to be fictitious and, second, it is not possible to establish the existence of a relationship of subordination between that person and his putative employer. However, it is for the referring court, taking account of all the relevant factors relating to that person and to the economic activity he carries on, to classify that person’s professional status under Directive 2003/88”.

O Trabalho 4.0 é concretizado, entre outras formas de trabalho, através do trabalho em plataformas digitais e promete desafiar as várias legislações vigentes, tanto no seio nacional como comunitário. Cabe, por essa razão, ao interprete a importante tarefa de conciliar os vários conceitos aplicáveis dos vários instrumentos legislativos sem, com isso, desvirtuar o princípio do primado do Direito da União Europeia.

David Carvalho Martins | Tiago Sequeira Mousinho | DCM LAWYERS