No recente acórdão do TC n.º 774/2019, foi submetida ao mecanismo de fiscalização abstrata e sucessiva de constitucionalidade a norma do art. 398.º/2 do CSC, ao determinar a extinção – por caducidade – do contrato de trabalho, celebrado há menos de um ano, de titular que seja designado administrador da sociedade empregadora ou de outra com que esta esteja em relação de domínio ou de grupo. A norma, em causa, relaciona-se e tem suscitado questões, ao longo dos anos, nas temáticas de: (i) proibição do cúmulo dos cargos de trabalhador e administrador; (ii) da natureza jurídico-laboral do comando normativo e respetiva conformidade com o seu processo de elaboração constitucional (normas de participação – preteridas – das estruturas de representação dos trabalhadores, próprias do Direito Coletivo do Trabalho).
A Jurisprudência maioritária tem recusado aplicar a norma com base na putativa inconstitucionalidade dado o seu escopo laboral, violando o disposto compreendido nos arts 54.º/5, alínea a) e 56.º/2, alínea a) da CRP , pese embora coexistam diferentes orientações, afastando caráter inovatório (e laboral) das normas, existindo, contrariamente, uma regulação da vida societária com meros reflexos laborais. O TC, assim, respondeu da seguinte forma: (i) a norma não repete o regime de caducidade por impossibilidade (art. 343.º/ alínea b) do CT) e, por isso, fornece um regime de extinção por caducidade distinto; (ii) a norma em causa é “legislação de trabalho”, sendo a intenção legislativa a de atuar no contrato de trabalho conformando o princípio de incompatibilidade. Ademais, o direito de participação tem de influir ou repercutir diretamente na situação jurídica destes (por extinção) e este é um caso evidente; (iii) existe uma preterição da obrigação constitucional de audiência das estruturas de representação; (iv) inexiste, ainda assim, um princípio de caso julgado negativo, que sane o vício com o (largo) decorrer do tempo; (v) apesar do vício de inconstitucionalidade, determinados valores ressalvam que os efeitos apenas poderão ser produzidos a partir da data de publicação (art. 282.º/1 e 4 da CRP).
Em suma, apesar da desconformidade constitucional, certos valores como a equidade e segurança prevalecem enquanto ode a situações jurídicas pretéritas. A decisão serve, ainda, para reforçar a natureza laboral que está materialmente subjacente à querela da proibição do cúmulo trabalhador-administrador.