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O Empregador público e (novamente) a conversão do Termo em Termo Indeterminado

By 26 Setembro, 2021No Comments

O Tribunal Central Administrativo -Norte, em acórdão de 2 de julho de 2021 (Helena Canelas), proc. n.º 02536/15.0BEPRT, veio mais uma vez pronunciar-se sobre o tema da conversão dos contratos a termo em contratos de trabalho por tempo indeterminado – que constitucionalmente se encontra vedado por via do art. 47.º, n.º 2. 

Primeiramente sobre este problema importa referir que a Constituição impõe a necessidade de concurso conforme reitera o art. 47.º, n.º 2 da CRP e igualmente o art. 30.º, n.º 4 da LTFP. 

Por sua vez, a contratação a termo é um mecanismo excecional de recrutamento que exprime a satisfação de necessidade temporárias do empregador e que somente poderá ser passível de aplicação nos casos expressamente admitidos pela lei (cf. arts. 57.º da LTFP e 140.º do CT). Concomitantemente, o elenco taxativo de fundamentos admissíveis para a subsunção deste regime encontra a sua raizon d´être na substituição de trabalhadores temporariamente ausentes e na existência de fundamentos específicos em função da realidade dinâmica dos empregadores públicos. 

No mais, estes contratos não poderão exceder o período de 3 anos, incluindo renovações, sendo somente renovável por 2 vezes conforme previsto no art. 60.º da LTFP. Mais se atendando, que se observa uma regra de não renovação automática do contrato a termo (art. 61.º, n.º 1 da LTFP). 

Volvendo ao acórdão mencionado, a premissa no tratamento deste tema, induz-se do preceito constitucional aludido na qual “a segurança no emprego deve levar à proibição ou à restrição apertada da celebração de contratos a termo certo, com uma regulamentação mais estrita dos pressupostos para a contratação a termo de trabalhadores, bem como a fixação de prazos de duração máxima destes contratos”. 

Por seu turno, da análise do art. 47.º, n.º 2 da CRP, o TCA-N giza que neste preceito se identifica um «direito especial de igualdade» no acesso à função pública, e também «um interesse institucional, da própria Administração Pública, na promoção da sua capacidade funcional e de prestação […] [e] um interesse de transparência e democraticidade na composição da função pública». 

O TCA-N menciona no seu iter o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 556/99, de 19 de Outubro, da 1ª Secção (Maria Helena Brito),Processo n.º 432/97, na qual se estabelece a regra do concurso público, que será realizado sempre que as necessidades de preenchimento de lugares de quadro se verificarem. Este concurso é uma forma de seleção de candidatos, em função das aptidões demonstradas, não se podendo afirmar, à partida, o direito subjetivo de qualquer dos candidatos à contratação”. Igual desenvolvimento tem a posição da Professora Ana Neves na qual “o concurso é justamente é justamente previsto como regra por se tratar do procedimento de seleção que, em regra, com maior transparência e rigor se adequa a uma escolha dos mais capazes – onde o concurso não existe e a Administração pode escolher livremente os funcionários não se reconhece, assim, um direito de acesso” (Ana Fernanda Neves, Relação Jurídica de Emprego Público, p. 147). 

Deste modo, se, se acolhesse a conversão do termo em tempo indeterminado, esta situação acarretaria, conforme explicita o Acórdão, a situação do surgimento de uma nova categoria de trabalhadores para o Estado por tempo indeterminado, os quadros de pessoal poderiam posteriormente vir a ser providos, a título definitivo, sem qualquer precedência do concurso constitucional e legalmente exigido. 

Não obstante, cabe ainda atender ao argumento da parte pela qual a conversão dos contratos a termo em contratos sem prazo não permitiria aferir uma lesão ao princípio da igualdade e que como tal um trabalhador ao abrigo do contrato de trabalho a termo, em situação de duração superior à duração máxima legal, sendo bastante para permitir que tal trabalhador possa vir a integrar por efeito automático uma convolação de contrato de trabalho a termo em contrato de trabalho por tempo indeterminado. 

Contudo, não se pode dizer que a substituição de um concurso para o acesso à função pública pela conversão de um contrato de trabalho a termo certo num contrato por tempo indeterminado seja compatível com o disposto no artigo 47.º, n.º 2, da Constituição. 

Por outro lado, Miguel Lucas Pires admite que com a entrada em vigor do quadro legal de 2008/2009, complementado pela Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de janeiro (alterada pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 de abril) a obrigatoriedade de abertura de concurso abrangia igualmente a constituição de vínculos a termo ou prazo (vide, inequivocamente, o art. 6.º, n.º 1, alínea b) e n.º 3 da citada Portaria). O mesmo sucede atualmente, por força da conjugação dos arts. 33.º a 38.º da LTFP e da Portaria n.º 125-A/2019 de 30 de abril (que, entretanto, revogou a congénere de 2009) [Miguel Lucas Pires, Confronto entre o Regime do Emprego Público e o Regime Laboral Privado, Almedina, 2021, pps. 149-150].  

Assim, segundo o autor, “encontrando-se a constituição de vínculos a termo obrigatoriamente sujeita a procedimento concursal prévio, poder-se-á questionar a manutenção da proibição da conversão daqueles contratos a termo em contratos por tempo indeterminado” [Miguel Lucas Pires, (…), p. 151]. 

Em suma, na conquista de um interesse legalmente protegido estará aberta uma nova brecha ao regime da proibição da conversão do termo em contrato por tempo indeterminado. 

Francisco Salsinha | DCM Lawyers