Uma das áreas em que a recente Lei 13/2023 mais profundamente inovou é a do estatuto “laboral” dos trabalhadores autónomos economicamente dependentes, sobretudo no que toca aos direitos coletivos.
Neste domínio, a lei configura um estranho tipo de relações entre esses trabalhadores e os sindicatos existentes – dos quais não são nem podem ser sócios. É-lhes reconhecido o “direito” de verem os seus interesses representados pelos sindicatos (naturalmente, dentro do sector económico ou âmbito profissional pertinente), o que parece significar, entre outras coisas, a possibilidade de exigirem a esses sindicatos que negoceiem convenções coletivas específicas e que lhes prestem serviços idênticos àqueles de que beneficiam os associados.
Apontam nesse sentido diversas remissões legais.
Entre tais serviços, parece estar também a intervenção dos sindicatos em processos judiciais e em procedimentos administrativos em que estejam em jogo interesses desses trabalhadores autónomos dependentes.
Ademais, o facto de não se tratar de filiados no sindicato impede que lhes seja exigido o pagamento de quotização, e nada consta da lei acerca de qualquer contrapartida económica para os referidos “serviços”, necessariamente onerosos dos pontos de vista técnico e financeiro.
Este insólito relacionamento entre o sindicato e pessoas que não estão nele inscritas como associadas, envolvendo incumbências e encargos impostos pela lei, à margem dos estatutos e do seu âmbito originário de atuação, parece incompatível com a dimensão coletiva da liberdade sindical.
Há nessas soluções ressonâncias evocativas do papel “confiado” pelo Estado aos sindicatos. Nenhuma associação sindical pode ser obrigada por lei a atuar à margem dos “estatutos e regulamentos por ela aprovados” (é o princípio da autorregulamentação: art. 55º/2 c) da CRP e art. 445º do Código do Trabalho)
Ou a “legislação específica” prometida introduz elementos novos, decididamente contrários ao sentido geral do regime agora publicado, ou se oferece o flanco à inconstitucionalidade quanto a esta matéria.
António Monteiro Fernandes @ Of Counsel, DCM | Littler