No passado dia 26.06.2020 foi publicado o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra no âmbito do Processo n.º 4354/19.7T8CBR-A.C2 no qual se decidiu que os recibos de vencimento devem ser juntos autos desde que deles apenas conste o montante do salário, com inclusão de todos os seus componentes retributivos, omitindo-se a referência a quaisquer outros elementos que, para além do montante da retribuição, deles eventualmente constem.
O autor desta ação alega a preterição, por parte da entidade empregadora, do princípio constitucional que determina que todos têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, de forma a assegurar que a trabalho igual corresponde salário igual (vide art. 59.º, n.º 1, al a) da Constituição da República Portuguesa).
Para fundamentar esta alegada desigualdade, solicitou que fossem juntos aos autos os recibos de vencimento de trabalhadores por si identificados, o que foi recusado pelo tribunal de 1ª instância face à proteção de dados em vigor face ao Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de Abril de 2016, nomeadamente face aos dados passíveis de identificar uma pessoa. Entendeu, pois, o tribunal que é essencial saber o valor da remuneração dos outros trabalhadores com funções de natureza, quantidade e qualidade iguais ao autor, a fim de apuramento da eventual desigualdade.
Contudo e considerando toda a restante informação passível de constar do recibo (por exemplo, a quotização sindical, faltas ao serviço, pagamento de seguros e de pensões de alimentos), haveria desproporcionalidade face ao objeto da ação, uma vez que se teria acesso a mais informação do que à estritamente necessária para avaliação da pretensão do autor.
Uma vez que o Acórdão é omisso, questiona-se se além da retribuição e demais componentes retributivos também não será informação essencial para o autor a informação da categoria profissional dos outros trabalhadores com quem está a comparar a sua situação remuneratória. E se só houver mais um trabalhador com a mesma posição que o autor? Não será, inevitavelmente, identificável mesmo com omissão das restantes informações? Nesse caso, que outras informações constantes do recibo se poderiam afigurar como admissíveis?
Cremos que mais questões deste género figurarão com mais frequência nos nossos tribunais, sendo que só o caso concreto poderá conceder possíveis respostas.
Catarina Venceslau de Oliveira | DCM LAWYERS