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Testes de honestidade: em quem confiar?

By 15 Março, 2022No Comments

A proteção de direitos de personalidade do trabalhador (arts. 14.º e ss. CT) conhece diferentes desafios (i) diante de aparelhos ou equipamentos tecnológicos de vigilância à distância, (ii) ou diante de diferentes tipos de vigilância humana (v.g., por pessoa a quem o empregador delega poderes de fiscalização e controlo na empresa, os apelidados compliance officers, ou mesmo por clientes mistério). 

Alguns destes meios desafiam o plano de licitude, como sucede no caso da videovigilância oculta, bem como o recurso a detetives privados ou a implementação de vigilantes nas sombras da empresa (o típico cenário de trabalhador-detetive), ainda que para a proteção de pessoas e bens, internos ou externos à organização. O plano de licitude a que nos reportamos poderá ser perspetivado em dois níveis: (i) ora, extrajudicialmente (ao nível de procedimentos disciplinares), (ii) ora judicialmente, onde maiores problemas são suscitados ao nível do domínio da prova ilícita e eventual aproveitamento desta prova enquanto manifestação do direito de acesso aos Tribunais e ao Direito, salvaguardando, essencialmente, o direito à prova (art. 20.º, n.º 1 CRP). 

As provas de honestidade não constituem exceção aos problemas suscitados. Considere-se o seguinte cenário: (A), empregador de (B), pretende conhecer do sentido ético e moral do seu trabalhador e, para tal, coloca uma nota de 20 euros “perdida” no seu espaço de trabalho, de modo a avaliar se o trabalhador devolve aquela quantia ou se, pelo contrário, guarda para si. 

No Ac. do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Sala de lo Social) de 31.07.2001, n.º de rec. 540/03 que serviu de base à discussão presente no Ac. do Tribunal Supremo (Sala de lo Social) de 09.07.2020, n.º de rec. 3083/2019, debateu-se a eventualidade de os detetives privados serem ou não comparáveis às “provas de honestidade” (aleatórias) diante dos trabalhadores. 

«Para combatir la legalidad de la actuación de los detectives invoca como sentencia de contraste la de la Sala de lo Social del Tribunal Superior de Justicia de Cataluña de 31 de julio de 2001, R. 540/03. En ella una trabajadora es despedida tras la realización de una “prueba de honestidad” que la empresa tiene por costumbre realizar, aleatoriamente, a sus empleadas con funciones de cajera. La prueba consiste en introducir dinero en la caja, normalmente, 10 euros y comprobar si la trabajadora informa del descuadre en cuestión o se queda con dichos euros. la trabajadora fue sometida a dicha prueba y no informó de los 10 euros sobrantes. Señaló que contabilizó 10 euros de más porque había contado dos veces un billete doblado. La trabajadora fue despedida». 

O Tribunal, para o caso, entendeu que não, dado que nas provas de honestidade aleatórias, não existe um fundamento de base, um argumento que tutele o interesse do empregador.  

O que não nos causa estranheza, atendendo ao facto de (i) se tratar de um esquema “ratoeira”, (ii) que permite ao empregador conhecer certos traços éticos e morais, próprias da concretização da sua personalidade, por forma desleal e, eventualmente, (iii) pelo facto do empregador provocar ou criar a decisão da prática do ato ilícito. 

Estaremos atentos. 

Tiago Sequeira Mousinho @ DCM | Littler