No quadro da relação laboral a lealdade entre partes é patente – vital para a manutenção contratual – e o legislador reconheceu, expressamente, este dever no art. 128.º/1, f) do CT, enquanto dever de sigilo (padrão) que vincula todos os trabalhadores. No âmbito do Código do Trabalho podemos encontrar outro tipo de sigilo, especial, voltado, neste caso, para os representantes dos trabalhadores (art. 412.º/1 e 2 do CT) que praticam atos específicos no exercício das suas funções, nomeadamente para efeitos da concretização da ação sindical na empresa.
A ideia subjacente é a de que – enquanto membros internos de uma organização – os trabalhadores estão particularmente próximos de informações sensíveis (v.g., dados pessoais de colegas ou de terceiros funcionalmente conexos com a empresa, segredos negociais, outras informações comercialmente relevantes). Deste modo, o legislador pretendeu acautelar os interesses da entidade empregadora, tendo por base que, em grande parte dos cenários, estão em causa empresas e ou empresários que atuam num mercado bastante aguerrido.
Note-se, contudo, que a existência de uma relação concorrencial e, porventura, de eventual concorrência desleal (noções diferentes, sublinhamos) não configuram requisito necessário ou constitutivo da violação do sigilo ou segredo.
Não obstante estas previsões de sigilo em sede da lei geral, existem outras manifestações de sigilo profissional. Em regra, estes deveres de segredo profissional, específicos, estão relacionados com a própria deontologia profissional (a título de exemplo, o segredo estatístico, o segredo de justiça, o segredo bancário, segredo médico…). Será de se constatar que grande parte das ordens profissionais sujeita os seus membros a esta obrigação. Mais uma vez, está em causa a proximidade do profissional, por exercício das suas funções ou em razão e natureza da atividade, com determinado tipo de informação – dotada de juridicidade – afeta a uma grande variedade de sujeitos.
No Ac. do TRG de 21.10.2021 (Antero Veiga), proc. 892/20.7T8BGC-A.G1, determinou-se que: “no quadro de uma relação laboral em que o trabalhador é um dos sócios e diretor financeiro, a exibição de parte da escrita comercial, tendo em vista demonstrar a utilização abusiva dos fundos da empresa por parte da gerência, reveste interesse na ação de impugnação de despedimento, tendo em conta a defesa do autor, que invoca a utilização do procedimento para o afastar da empresa”. O segredo de escrituração mercantil é um dever vital para a proteção das sociedades comerciais portuguesas, dado que o mesmo visa proteger informação sensível acerca daquelas (vida interna da organização).
Contudo, destaca ainda o Tribunal, nada obsta a que certas informações – cujo acesso seja, ab initio, vedado – não possam sofrer uma ligeira limitação. I.e., escamotear a obrigação de sigilo, revelando um pouco da informação, para defesa de interesses preponderantes e relevantes. Neste sentido, estabeleceu-se que: “O artigo 435º do CPC remete para legislação comercial no que se refere à exibição judicial, por inteiro, dos livros de escrituração comercial e dos documentos a ela relativos. Tal norma não obsta à exibição parcial, quando com interesse para a causa. Sendo a requerida parte no processo e com responsabilidade na questão, sempre seria possível ao abrigo do artigo 43º do C.Com. a solicitação parcial de elementos, verificado o interesse para a causa e efetuada a devida ponderação dos interesses em jogo”.
Chegando a este a ponto, cumpre destacar a existência de diversas obrigações de sigilo. Gerais e específicas, as que são dotadas de vinculatividade absoluta e as relativas. Atendendo a esta pequena teia de segredos, figura-se de difícil concretização a linha que separa a informação vedada e da informação que pode ser acedida. E, doutro prisma, a linha que separa a proteção de interesses da violação do sigilo.
Estaremos atentos ao desenrolar deste tema.
Tiago Sequeira Mousinho @ DCM | Littler