No passado dia 24 de fevereiro de 2022 foi decidido por acórdão do Tribunal de Justiça, processo C-389/20, um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Tribunal de Contencioso Administrativo n.° 2 de Vigo, Espanha.
No referido acórdão, os factos que espoletaram as questões prejudiciais foram, sumariamente, os seguintes (i) “CJ” uma senhora que prestava trabalho de serviço doméstico, tendo como entidade empregadora uma pessoa singular desde janeiro de 2011, inscrita no regime especial de segurança social aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico; (ii) a 8 de novembro de 2019 solicitou junto da Segurança Social autorização para proceder ao pagamento de contribuições relativas à proteção contra o risco de desemprego para adquirir o direito às prestações, tendo sido o requerimento acompanhado do consentimento escrito da entidade empregadora para o pagamento da contribuição pedida; (iii) o requerimento foi indeferido, a Trabalhadora recorreu hierarquicamente do indeferimento, no entanto a decisão foi confirmada no recurso hierárquico; (iv) não comoda com a decisão a Trabalhadora recorreu da decisão hierárquica para o Tribunal de Contencioso Administrativo n.º 2 de Vigo, alegando, em síntese, que a disposição que excluí os trabalhadores do serviço doméstico das prestações por situação de desemprego, coloca-os numa situação de desproteção social quando, por razões que não lhes são imputáveis, a relação laboral cessa. Nesta senda, foi decidida a suspensão da instância e submetidas as seguintes questões prejudiciais:
- Devem o artigo 4.º, n.º 1, da [Diretiva 79/7], sobre igualdade de tratamento[,] que impede qualquer discriminação em razão do sexo, quer direta quer indiretamente, na obrigação de contribuição para a segurança social, e o artigo 5.º, alínea b), da [Diretiva 2006/54], que prevê uma proibição idêntica de discriminação direta ou indireta em razão do sexo, no que respeita ao âmbito dos regimes sociais e às condições de acesso aos regimes, bem como à obrigação de pagar as quotizações e ao cálculo destas, ser interpretados no sentido de que se opõem a uma norma nacional como o artigo 251.º, alínea d), da [Ley General de la Seguridad Social (Lei Geral da Segurança Social)] […] “d) A proteção conferida pelo [regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico] não abrange a prestação de desemprego”?
- Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, deve a referida disposição ser considerada um exemplo de discriminação proibida, na aceção do artigo 9.º, n.º 1, alíneas e) e/ou k), da [Diretiva 2006/54], na medida em que as destinatárias da norma em causa, artigo 251.º, alínea d), [da] LGSS, são quase exclusivamente mulheres?
A resposta do Tribunal de Justiça foi a seguinte:
O artigo 4.º, n.º 1, da Diretiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional que exclui as prestações de desemprego das prestações concedidas por um regime legal de segurança social aos trabalhadores do serviço doméstico, quando se verifica que esses trabalhadores são quase exclusivamente mulheres.
Em Portugal só têm direito ao subsídio de desemprego os trabalhadores que estejam a descontar para a Segurança Social sobre a remuneração efetivamente auferida em regime de contrato de trabalho mensal a tempo completo. (Cfr. Guia da Segurança Social, páginas 15-16)
A questão que pode colocar-se é a de saber se estes trabalhadores do Serviço Doméstico, excluídos do recebimento do subsídio de desemprego, podem estar também numa situação idêntica àquela que é descrita no acórdão, sobretudo verificando-se que esses trabalhadores são quase exclusivamente mulheres e, bem assim, a trabalhar por hora e não sob contratos mensais a tempo completo.
A jurisprudência do Tribunal de Justiça apresenta passos importantes no combate das desigualdades (sobretudo as indiretas). Continuaremos atentos.
Ana Amaro @ DCM | Littler