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Transmissão de unidade económica no TJ: 2018-2019

A interpretação-aplicação do regime laboral de transmissão de unidade económica (arts. 285-287 e 498.º do CT, e 244.º, n.os 3 e 4, da LGTFP) convoca, invariavelmente, a jurisprudência do TJ. Nesse sentido, cumpre apresentar um breve resumo dos casos decididos em 2018 e 2019.

a) TJ 7.8.2019 (caso Colino Sigüenza) proc. n.º C-472/16: (i) o instituto é aplicável às transmissões indiretas, nomeadamente a uma situação em que o adjudicatário (cedente) de um contrato público de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música, a quem o município (cliente ou beneficiário da atividade) tinha fornecido todos os meios materiais necessários ao exercício desta atividade, promove a sua cessação dois meses antes do final do ano letivo em curso, procedendo ao despedimento dos trabalhadores e devolvendo esses meios materiais ao município, que procede a uma nova adjudicação apenas para o ano letivo seguinte e fornece ao novo adjudicatário (cessionário) os referidos meios materiais; (ii) deve verificar-se se esse despedimento, ainda que por motivos económicos, técnicos ou organizativos (v.g. falta de meios financeiros para pagar as remunerações), se ficou a dever unicamente à transmissão; (iii) cabe apurar, para esse efeito, se existiu o intuito de privar os trabalhadores da proteção conferida pelo instituto;

b) TJ 11.7.2018 (caso Somoza Hermo) proc. n.º C-60/17: (i) o instituto é também aplicável a uma situação em que um contratante (cliente ou beneficiário da atividade) resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância de instalações celebrado com uma empresa (cedente) e, para efeitos dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa (cessionário) que, por força de uma convenção coletiva, integra uma parte essencial, em termos de número e de competências, dos efetivos que o cedente afetava àquela atividade, desde que a operação seja acompanhada da transferência de uma unidade económica entre o cedente e o cessionário; (ii) um conjunto de trabalhadores que executa de forma duradoura uma atividade comum de vigilância pode, na falta de outros fatores de produção, corresponder a uma entidade económica;

c) TJ 8.5.2019 (caso Jadran Dodič) proc. n.º C-194/18: (i) a assunção pelo cessionário de instrumentos financeiros e de outros ativos de clientes do cedente, na sequência da cessação da sua atividade, por força de um contrato imposto pela legislação nacional, ainda que os clientes do cedente sejam livres de não confiar a gestão dos seus títulos em bolsa ao cessionário, pode constituir uma transmissão de unidade económica, desde que seja demonstrada a transferência de clientela; (ii) a circunstância de 91% dos clientes do cedente terem aceitado a gestão dos seus títulos pelo cessionário é um elemento interpretativo importante, mas não é, por si só, decisivo para a aplicação do instituto.

d) TJ 16.5.2019 (caso Christa Plessers) proc. n.º C-509/17: o Direito europeu opõe-se a uma legislação nacional que atribui ao cessionário o direito de escolher os trabalhadores que pretende retomar, designadamente no caso de uma transmissão de unidade económica efetuada no âmbito de um processo de reorganização judicial que determine a transferência com manutenção da totalidade ou de uma parte do cedente ou das atividades deste;

e) TJ 13.6.2019 (caso Correia Moreira) proc. n.º C-317/18: (i) um contrato de trabalho em comissão de serviço vigente na data da transmissão fica abrangido pelo instituto; (ii) o Direito europeu opõe-se a uma legislação nacional que obrigue o trabalhador a submeter-se a um concurso público e a um novo vínculo com o cessionário, no caso de transmissão de uma unidade económica para um município, desde que esta não se enquadre no exercício de prerrogativas de poder público.

A Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001, continua a suscitar dúvidas aos tribunais nacionais e a justificar regulares intervenções do TJ. A convocação da teoria do ato claro para recusar o reenvio prejudicial tem evidentes dificuldades neste domínio.

Deste modo, para além da resposta às dúvidas e incertezas criadas, entre nós, pela Lei n.º 14/2018, os gestores devem ter em conta a interpretação do TJ – ou, melhor, o desenvolvimento da jurisprudência europeia – sobre o alcance da Diretiva, designadamente, no momento da tomada de uma legítima de decisão de gestão de internalizar ou de externalizar uma unidade de negócio.

David Carvalho Martins

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