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Atualidade laboral: Deepfakes no contexto laboral – Que desafios?

By 19 Setembro, 2024Setembro 27th, 2024No Comments

Artigo da autoria de Tiago Sequeira Mousinho para a RHmagazine by IIRH. 

A realidade prática é (bem) mais criativa que o autor deste texto. Assim sendo, por razões de facilidade de exposição, propomos (1.) adiantar alguns casos de escola (cuja similitude com a realidade é mera coincidência, conforme nos adiantam alguns clássicos de cinema), sendo seguidos de (2.) alguns conceitos e finalidades que, aqui, relevam e, por fim, (3) algumas propostas de solução.

Vejamos, então:

1. Comecemos por alguns exemplos…

Abel, conhecido no seu trabalho por dominar as novas tecnologias, utilizou umas fotografias e audios que dispunha de Bela, colega de trabalho, sem a autorização desta, para criar vídeos de teor bastante sugestivo. Para tal, durante a hora de almoço e na cantina da empresa empregadora, recorreu a uma aplicação (“app” ou “software”) do seu smartphone para criar estes vídeos que, segundo aquele, constituem uma mera “brincadeira”.

Xavier, trabalhador conhecido por gerir contas de clientes de um modo “quase automático”, recebeu, na sua primeira hora de trabalho e na sua caixa de e-mail, um pedido de envio de listagem de clientes que, nos últimos 3 meses, solicitou uma revisão de preços. Xavier verificou que o pedido terminava com “podes, pf., dar andamento a esta tarefa?”, frase típica do seu superior hierárquico, todavia, não confirmou que o endereço e-mail, embora aparentemente igual, dispunha apenas de um caracter diferente. Com efeito, enviou prontamente esta listagem a um desconhecido, contando que estava a cumprir com uma ordem expressa e direta do seu superior hierárquico.

Mário, talentoso informático que se encontrava a cumprir pré-aviso até à data de cessação do seu contrato de trabalho, decidiu entrar no sistema informático da sua (ainda) empresa empregadora “XPTO” para fabricar alguns “tickets” de pedido de auxílio informático, de modo a aceder aos computadores dos seus colegas e, com isso, ter um registo legítimo de acesso. Deste modo, simulou, ainda, alguns áudios no Whatsapp profissional, para reforçar esta legitimidade. Com efeito, extraiu toda a informação comercialmente sensível e logrou ocultar todo o fenómeno extrativo.

E agora… O que dizer?

2. Deepfakes: O que é? Para que serve?

Esta visão já “tradicional” do que é um “deepfake” pode ir mais longe, valendo não só para os vídeos, como para os sons, ou mesmo para a escrita de alguém, substituindo essa pessoa (quase) no seu todo – dando, para o efeito, a aparência de ser real.

Nestes termos, falamos de uma manipulação – através de meios tecnológicos, digitais e, por vezes, com recurso a inteligência artificial – do Ser ou da realidade, de modo a criar uma aparência noutrem – levando a que seja possível criar um efeito ou resultado, levando a que seja

possível obter um comportamento (ação ou omissão) da pessoa objeto deste processo de manipulação.

Se é verdade que um vídeo, no YouTube, a simular Donald Trump ou mesmo Barack Obama, é objeto de estudo, de alguma admiração e até de humor… também será verdade que a facilitação e difusão deste tipo de tecnologia e, nalguns casos, de recurso a inteligência artificial, pode revelar-se bastante pernicioso e, nalguns casos, fatal, v.g., para a dignidade e a imagem (ou o bom nome) de uma pessoa, a sua “incriminação”, ou para a proteção de ativos intangíveis, como são os segredos de negócio de um comerciante.

Os riscos não serão diferentes no local e durante o tempo de trabalho – quer para a proteção de trabalhadores, de possíveis cenários de assédio moral ou sexual, ou a repressão disciplinar destas infrações, quer para a proteção de empresas empregadoras diante de certos fenómenos de ataque e desorganização (concorrência desleal), vulneração de segredo negocial, ou mesmo de espionagem industrial.

3. Como reagir? O que fazer? (Algumas propostas)

No contexto laboral, cumpre salientar que as empresas empregadoras têm um poder-dever de conformar o local e o ambiente de trabalho de um modo seguro, do ponto de vista físico como também psicológico. Com efeito, de modo a evitar constrangimentos, contingências e riscos, podem fazer uso do seu poder regulamentar e disciplinar. Podem, também, dar formação e culturalizar sobre os assuntos suscetíveis de afetar o local e meio de trabalho: no caso, a invasão pelos deepfakes. Além destes atos de índole mais jurídica, podemos conceber outros de índole material, como o reforço do espaço digital da empresa, aposta em mecanismos tecnológicos mais robustos e capazes de fazer frente às novas ameaças, sejam elas internas ou externas.

Algumas empresas, além-fronteiras, passaram a definir programas de formação e de cultura sobre os riscos das novas tecnologias, apostando na proteção no meio digital e na cibersegurança. Outras, apostam em políticas de uso da conta de e-mail profissional, ou do uso dos smartphones e Iphones durante o tempo e no local de trabalho, assim como o uso das redes sociais e dos aplicativos na empresa. Mais recentemente, fala-se de um fenómeno de e-discovery laboral, que no fundo, vem inovar em matéria de prova digital e de registo eletrónico de informação – para, precisamente, dar resposta ao complexo problema de recolha de prova e arquivo.

Se é verdade que a criatividade e a inovação podem constituir ameaças, nalguns contextos, não deixa de ser igualmente verdade que estas duas noções podem (i) prevenir, por um lado, ou (ii) dar uma resposta executória. Compete-nos, pois claro, dedicar alguma atenção aos futuros desenvolvimentos.