O tema das cláusulas de condição suspensiva no contexto dos contratos de trabalho desportivos foi alvo de análise e pronúncia por parte do Supremo Tribunal de Justiça (“STJ”), nomeadamente no âmbito do Processo n.º 23239/21.0T8LSB.L1.S1.
No presente caso, foi instaurada uma ação por parte do praticante desportivo no âmbito da celebração de um contrato de trabalho desportivo com um determinado Clube, cuja duração estava prevista para duas épocas desportivas, ou seja, entre julho de 2021 e junho de 2023. A questão colocou-se quanto a uma cláusula de condição suspensiva, que estipulava que o vínculo só produziria efeitos após aprovação do jogador em exames médicos e físicos.
Porém, o atleta sofreu uma lesão antes da data estipulada para o início do contrato, tendo sido submetido a uma intervenção cirúrgica ao joelho. Embora a recuperação estivesse prevista para um prazo razoável que permitiria o seu regresso à atividade desportiva, o Clube, após realizar exames médicos adicionais, considerou o praticante desportivo inapto para jogar, notificando-o oficialmente de que o contrato não tinha entrado em vigor.
Analisando o caso em apreço, cabe ademais frisar que, antes da questão da condição suspensiva, veio o Tribunal da Relação qualificar a natureza do contrato celebrado, reconhecendo que se tratava de um contrato de trabalho desportivo, contrariando assim o alegado pelo Clube, que entendia estar em causa uma prestação de serviços.
Face a tal decisão, optou o Clube por recorrer, de seguida, para o STJ, numa tentativa de que o contrato fosse declarado inválido por não verificação da condição suspensiva. Nesta senda, veio o STJ referir que, de acordo com o Código Civil português, podem as partes subordinar a produção de efeitos do negócio jurídico a uma condição suspensiva, que consiste numa disposição contratual que suspende os efeitos do contrato até que ocorra um evento futuro e incerto. Segundo o clube, a condição não havia sido cumprida, na medida em que consideraram que o jogador estava inapto para jogar no início da época desportiva, o que justificava a ausência de efeitos do contrato.
Porém, o STJ considerou que se tinha verificado a condição, dado que o jogador chegou a ser avaliado pela equipa médica do Clube e considerado por está apto a jogar a partir do mês de novembro da época em causa.
Neste sentido, a comunicação feita pelo Clube configurou um despedimento ilícito, dado que foi considerado pelos nossos tribunais que (i) estava em causa um contrato de trabalho desportivo; (ii) verificou-se a ocorrência da condição suspensiva da qual dependia a produção de efeitos do contrato de trabalho.
Ora, embora a Lei n.º 54/2017, de 14 de julho não regule concretamente a ilicitude do despedimento de um praticante desportivo, menciona a existência de uma responsabilidade pela parte que tenha promovido indevidamente a cessação do contrato, seja por despedimento ou resolução sem justa causa.
Assim, segundo o art. 24.º da referida Lei, a parte deverá indemnizar a contraparte pelo valor das retribuições que seriam devidas ao praticante desportivo caso o contrato tivesse cessado no seu termo.
Porém, surge a questão de saber se a ausência de regulação de um despedimento ilícito pela referida Lei, nos remete obrigatoriamente para o âmbito do regime geral do Código do Trabalho, considerando a sua aplicação subsidiária.
Será o regime geral da ilicitude do despedimento compatível com a especificidade do mundo laboral desportivo?
Marta Coelho Valente e Carolina Caldeira Fernandes @ DCM | Littler