No passado dia 10 de outubro de 2024, o Governo apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 26/XVI/1.ª para efeitos de aprovação do Orçamento do Estado para o próximo ano. Enquanto ainda decorre o processo de votação parlamentar, antecipamos desde já as novidades que dizem diretamente respeito à matéria laboral. Assinalamos as propostas com repercussão direta ou indireta em contexto laboral, para o setor privado e para o setor público.
Disposições gerais
Escalões do IRS
Prevê-se a atualização dos limites de cada escalão das taxas gerais de IRS em cerca de 4,6%.
Regime IRS Jovem
Propõe-se um alargamento do regime atualmente em vigor, podendo passar a abranger jovens que reúnam, em simultâneo, as seguintes condições, por um prazo de 10 anos:
- Aufiram rendimentos do trabalho dependente e/ou rendimentos do trabalho independente;
- Não sejam considerados dependentes para efeitos fiscais;
- Tenham até 35 anos;
Além, da extensão do limite máximo da idade (atualmente até 26 anos ou até 30 anos, no caso de conclusão de doutoramento) e do prazo em vigor (5 anos após a conclusão do ciclo de estudos), prevê-se a eliminação da condição relativa à conclusão de um ciclo de estudos.
Prevê-se ainda o aumento da isenção nos seguintes termos:
- 100 % no 1.º ano de obtenção de rendimentos;
- 75 % do 2.º ao 4.º ano de obtenção de rendimentos;
- 50 % do 5.º ao 7.º ano de obtenção de rendimentos;
- 25 % do 8.º ao 10.º ano de obtenção de rendimentos.
O valor do rendimento isento nos termos acima expostos passa a estar limitado a um montante correspondente a 55 vezes o valor do IAS (28 009,30€, considerando o IAS atualmente em vigor).
Propõe-se ainda a exclusão do regime para os sujeitos passivos que:
- beneficiem ou tenham beneficiado do regime do residente não habitual;
- beneficiem ou tenham beneficiado do incentivo fiscal à investigação científica e inovação;
- tenham optado pela tributação nos termos do regime fiscal aplicável a ex-residentes;
- não tenham a situação tributária regularizada.
Subsídio de refeição
Propõe-se a manutenção de um limiar a partir do qual deixa de existir isenção fiscal para subsídios de refeição atribuídos através de vales de refeição, procedendo-se a um aumento daquele, passando a ser considerado rendimento do trabalho dependente apenas a parte que exceda em 70% o limite legal estabelecido (atualmente, 6,00€), ao invés dos anteriores 60%.
Trabalho suplementar
Quando for paga remuneração relativa a trabalho suplementar, propõe-se que a taxa de retenção a aplicar seja a que corresponder a 50% da taxa aplicável à remuneração mensal do trabalho dependente referente ao mês em que aquela seja paga ou colocada à disposição.
Deduções específicas – categoria A e H
Propõe-se uma atualização da dedução específica aplicável aos rendimentos do trabalho dependente e de pensões para um montante correspondente a 8,54 vezes o valor do IAS (o que corresponderia a, atualmente, 4 349,08€, ao invés da importância fixa de 4 104,00€).
Atividades profissionais – retenção na fonte
Propõe-se a redução de 25% para 23% da taxa de retenção na fonte de IRS aplicável aos rendimentos decorrentes das atividades profissionais previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º do CIRS.
Pagamentos por conta
O total dos pagamentos por conta a serem efetuados deverá corresponder a 65% do valor calculado de acordo com a fórmula estabelecida para esse fim (em contraste com a percentagem atual, que é de 76,5%).
Mínimo de existência
Propõe-se a revisão do valor do mínimo de existência (o limite de rendimento isento de IRS), fixando-o em 12 280,00€, em linha com o aumento da remuneração mínima mensal garantida (RMMG) para 870,00€.
Taxa geral de IRC
Propõe-se a redução da taxa de IRC de 21% para 20%.
Às pessoas coletivas que sejam qualificadas como pequena ou média empresas, ou ainda, empresa de pequena-média capitalização e que exerçam, direta ou indiretamente, a título principal, atividade económica de natureza agrícola, comercial ou industrial, pretende-se aplicar uma taxa de 16% de IRC (atualmente de 17%) aos primeiros 50 000,00€ de matéria coletável, e de 20% quanto ao excedente.
Seguros de saúde ou doença
Os gastos suportados com seguros de saúde ou doença em benefício dos trabalhadores, reformados ou respetivos familiares, quando considerados realizações de utilidade social, poderão passar a ser considerados em 120% do seu valor.
Incentivo fiscal à valorização salarial
Os encargos com os aumentos salariais poderão passar a ser majorados em 200% (atualmente 150%), até um montante máximo anual, por trabalhador, de cinco vezes a RMMG (atualmente quatro vezes), quando:
- o aumento da retribuição base anual média por trabalhador, por referência ao final do ano anterior seja, no mínimo, de 4,7 %;
- o aumento médio da retribuição base anual dos trabalhadores que aufiram um valor inferior ou igual à retribuição base média anual da empresa no final do ano anterior seja, no mínimo, de 4,7 %; e
- sejam abrangidos por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, celebrado ou atualizado há menos de 3 anos.
Prémios de produtividade, desempenho, participações nos lucros e gratificações de balanço – IRS e Segurança Social
Os prémios de produtividade, desempenho, participação nos lucros e gratificações de balanço, desde que pagos voluntariamente e sem caráter regular, poderão passar a estar isentos de IRS e TSU até 6% do valor da remuneração base anual do trabalhador. Este regime aplicar-se-á aos empregadores que cumpram os requisitos referidos no ponto anterior.
Incentivo à recapitalização das empresas
Propõe-se que o sujeito passivo de IRS que realize entradas de capital em dinheiro a favor de uma sociedade na qual detenha uma participação social possa deduzir até 20% dessas mesmas entradas ao montante bruto dos lucros distribuídos por essa sociedade ou, no caso de alienação desta participação, ao saldo entre as mais-valias e menos valias apuradas.
Prorrogação de benefícios fiscais previstos no EBF:
- deduções no âmbito de parcerias de títulos de impacto social (art. 19.º-A);
- incentivos fiscais à atividade silvícola (art. 59.º-D);
- entidades de gestão florestal e unidades de gestão florestal (art. 59.º-G);
- embarcações eletrossolares ou exclusivamente elétricas (art. 59.º-J).
É ainda prorrogado, até 31 de dezembro de 2025, o regime extraordinário de apoio a encargos suportados na produção agrícola (artigo 240.º da Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro).
Disposições especiais aplicáveis ao setor público administrativo
Ajudas de custo, trabalho suplementar e trabalho noturno nas fundações públicas e nos estabelecimentos públicos
Os regimes de ajudas de custo, trabalho suplementar e trabalho noturno previstos no Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de abril, na sua redação atual, e na LFTP, pretendem-se aplicáveis aos trabalhadores das fundações de direito público, das fundações públicas de direito privado e dos estabelecimentos públicos, salvo o disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
Programas específicos de mobilidade e outros instrumentos de gestão
Propõe-se que sejam remunerados nos termos da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, pela posição remuneratória imediatamente seguinte àquela em que se encontrem posicionados na categoria ou, em caso de inexistência de categoria, pelo nível remuneratório que suceda ao correspondente às suas posições na tabela remuneratória única, os trabalhadores que se encontrem abrangidos por programas específicos de mobilidade que:
- se baseiem em razões de especial interesse público; e
- sejam autorizados pelos membros do Governo responsáveis pela área da Administração Pública e das Finanças, sob proposta do membro do Governo responsável em razão da matéria,
Além disso, os órgãos ou serviços da Administração Pública deverão apresentar um planeamento da valorização dos seus profissionais, nos termos definidos no decreto-lei de execução orçamental. Para tal, aplicam-se os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho e outros instrumentos legais ou contratuais vigentes ou, na sua falta, o disposto no decreto-lei de execução orçamental.
Acresce que as situações de mobilidade existentes à data da entrada em vigor do Orçamento do Estado de 2025 e cujo limite de duração máxima ocorra durante o mesmo ano podem, por acordo entre as partes, ser excecionalmente prorrogadas até 31 de dezembro de 2025.
Esta prorrogação é, ainda, aplicável às situações de mobilidade cujo termo ocorra até à data da entrada em vigor do Orçamento do Estado de 2025, nos termos do acordo entre as partes, previsto no número anterior.
Aplicação de regimes laborais especiais na saúde
Propõe-se que os níveis retributivos, incluindo suplementos remuneratórios, dos trabalhadores com contrato nos estabelecimentos ou serviços do SNS, com natureza de entidade pública empresarial, celebrados após a entrada em vigor do Orçamento de Estado de 2025, não possam ser superiores e sejam estabelecidos nos mesmos termos dos correspondentes aos trabalhadores com contrato de trabalho em funções públicas inseridos em carreiras gerais ou especiais.
O suprarreferido é igualmente aplicável aos acréscimos remuneratórios devidos pela realização de trabalho noturno, trabalho em dias de descanso semanal obrigatório e complementar e trabalho em dias feriados.
De destacar que estas regras são aplicáveis a todos os profissionais de saúde do SNS, independentemente da natureza jurídica da relação de emprego, salvo exceções previstas pelo decreto-lei de execução orçamental.
Contratação de médicos aposentados
Propõe-se que os médicos aposentados que exerçam funções em serviços da administração central, regional e local, empresas públicas ou quaisquer outras pessoas coletivas públicas, mantenham a respetiva pensão de aposentação, acrescida de 75% da remuneração correspondente à categoria e, consoante o caso, escalão ou posição remuneratória detida à data da aposentação, assim como o respetivo regime de trabalho, podendo os pedidos de acumulação de rendimentos apresentados a partir da entrada em vigor do Orçamento de Estado de 2025 autorizados nos termos do decreto-lei de execução orçamental.
Sem prejuízo do referido anteriormente, nos casos em que a atividade contratada pressuponha uma carga horária inferior à do regime de trabalho detido à data da aposentação, nos termos legalmente estabelecidos, propõe-se que o médico aposentado seja remunerado na proporção do respetivo período normal de trabalho semanal.
Aposentados e exercício de funções públicas na área da cooperação
Os aposentados ou reformados com experiência relevante em áreas que contribuam para a execução de projetos de cooperação para o desenvolvimento poderão passar a exercer funções públicas na qualidade de agentes da cooperação.
Passagem às situações de reserva, pré-aposentação ou disponibilidade
São definidas as situações/circunstâncias em que os militares da GNR, pessoal com funções policiais da PSP, da Polícia Judiciária, da Polícia Marítima, de outro pessoal militarizado e de pessoal do corpo da Guarda Prisional poderão passar às situações de reserva, pré-aposentação ou disponibilidade. São elas:
- Em situações de saúde devidamente atestadas;
- No caso de serem atingidos ou ultrapassados os limites de idade ou de tempo de permanência no posto ou na função, bem como quando, nos termos legais, estejam reunidas as condições de passagem à reserva, pré-aposentação ou disponibilidade depois de completados 36 anos de serviço e 55 anos de idade;
- Em caso de exclusão da promoção por não satisfação das condições gerais para o efeito ou por ultrapassagem na promoção em determinado posto ou categoria, quando tal consequência resulte dos respetivos termos estatutários;
- Quando, à data da entrada em vigor da presente lei, já estejam reunidas as condições ou verificados os pressupostos para que essas situações ocorram, ao abrigo de regimes aplicáveis a subscritores da CGA, I. P., de passagem à aposentação, reforma, reserva, pré-aposentação ou disponibilidade, independentemente do momento em que o venham a requerer ou a declarar.
Contratação de trabalhadores aposentados para o setor ferroviário
Os aposentados ou reformados com experiência em áreas de manutenção de material circulante ou em funções de maquinista poderão passar a exercer funções nas empresas públicas de setor ferroviário que procedam ao transporte coletivo de passageiros, mantendo a respetiva pensão de aposentação, acrescida de até 75% da remuneração correspondente à categoria, consoante o escalão ou posição remuneratória à data da aposentação.
Faça download da Nota Informativa aqui.
Rui Rego Soares, Rute Gonçalves Janeiro e João Silva Ribeiro @ DCM | Littler