artigos...

À Experiência? O período experimental na Função Pública e no sector privado.

O período experimental constitui uma fase inicial da relação laboral que visa permitir a ambas as partes – entidade empregadora pública e trabalhador – a adequada avaliação do posto de trabalho e das funções a desempenhar. Na Administração Pública portuguesa, este período assume especificidades próprias, reguladas fundamentalmente pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – LGTFP), com remissões subsidiárias para o Código do Trabalho.

Nos termos do artigo 45.º da LGTFP, o período experimental aplica-se aos trabalhadores em funções públicas com vínculo de emprego público por tempo indeterminado ou a termo, tendo como principal objetivo aferir se o trabalhador possui as competências e perfil adequados ao exercício das funções inerentes ao posto de trabalho a ocupar.

De acordo com o n.º 1 do artigo 45.º da LGTFP, o período experimental tem diferentes durações. Para os contratos por tempo indeterminado, o período experimental subdivide-se da seguinte forma:

  • Para trabalhadores integrados na carreira de assistente operacional e noutras carreiras ou categorias com idêntico grau de complexidade funcional, a duração é de 90 dias;
  • Para os trabalhadores integrados na carreira de assistente técnico e noutras carreiras ou categorias com idêntico grau de complexidade funcional, o período estende-se até 180 dias;
  • Para os trabalhadores integrados na carreira de técnico superior e noutras carreiras ou categorias com idêntico grau de complexidade funcional e para cargos de direção ou chefia, o período experimental poderá atingir 240 dias.

Já para os contratos em funções públicas a termo, o período experimental tem durações mais curtas (i) 30 dias no contrato a termo certo de duração igual ou superior a seis meses e no contrato a termo incerto cuja duração se preveja vir a ser superior àquele limite, (ii) 15 dias, no contrato a termo certo de duração inferior a seis meses e no contrato a termo incerto cuja duração se preveja não vir a ser superior àquele limite.

Durante este período, as partes mantêm todos os direitos e deveres típicos da relação de emprego público, incluindo os deveres de assiduidade, pontualidade e obediência hierárquica. Contudo, uma vez concluído o período experimental sem sucesso, o contrato cessa os seus efeitos automaticamente, sem direito a qualquer indemnização ou compensação. Ainda durante o período experimental, desde que por ato devidamente fundamentado pela entidade, o contrato poderá cessar antes do respetivo termo, quando o trabalhador revele não possuir as competências exigidas para o posto de trabalho que ocupa.

A avaliação do período experimental é realizada por um júri, especialmente constituído para o efeito que, a final, procede á avaliação do trabalhador e do seu desempenho. Esta avaliação final terá em consideração (i) o relatório que o trabalhador apresente, (ii) as ações de formação frequentadas e (iii) outros elementos e considerações que o Júri considere relevantes e tenha recolhido ao longo do período experimental.

Para que o período experimental seja concluído com sucesso, a média de todos os fatores referido supra, deve ser ponderado em valor igual ou superior a 14 valores.

Comparação com o Setor Privado

O período experimental, tanto no setor privado como na Administração Pública, tem como principal finalidade permitir que ambas as partes – empregador e trabalhador – avaliem se existe uma adequada correspondência entre o posto de trabalho e o perfil da pessoa contratada. No entanto, existem diferenças significativas entre o regime previsto no Código do Trabalho (CT) e o estabelecido na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), refletindo a natureza distinta de cada relação laboral.

No setor privado, o período experimental encontra-se regulado nos artigos 111.º a 114.º do Código do Trabalho. Trata-se de uma fase inicial do contrato durante a qual qualquer das partes pode pôr termo à relação contratual de forma mais simplificada. As durações do período experimental variam consoante o tipo de função: 90 dias para a maioria dos trabalhadores, 180 dias para cargos que exijam qualificação técnica ou grau académico superior, e até 240 dias para cargos de direção ou responsabilidade superior. A cessação do contrato por parte do empregador pode ocorrer sem aviso prévio e sem necessidade de invocar justa causa. Já o trabalhador pode rescindir sem aviso prévio durante o período experimental.

Na função pública, o período experimental está previsto nos artigos 45.º e 46.º da LGTFP. Também aqui se aplica a trabalhadores com vínculo por tempo indeterminado e a duração é similar ao regime privado. Contudo, ao contrário do regime do Código do Trabalho, na Administração Pública a cessação do vínculo durante o período experimental está sujeita a fundamentação obrigatória, ainda que sucinta, e deve respeitar os princípios da legalidade, da proporcionalidade e da boa-fé. A decisão não exige processo disciplinar nem audiência prévia, mas não pode ser arbitrária. Esta diferença resulta da sujeição da Administração Pública aos princípios do direito administrativo, sendo os seus atos impugnáveis em sede de jurisdição administrativa.

Outra diferença importante prende-se com a forma como o desempenho é avaliado durante o período experimental. No setor privado, essa avaliação tende a ser informal ou até inexistente, dependendo do grau de organização da empresa. Já na Administração Pública, existe uma avaliação formal, com um Júri constituído para o efeito e apresentação de documentação de suporte à avaliação final.

Importa, ainda, salientar que, enquanto no setor privado a conclusão do período experimental pode ou não resultar na consolidação de um vínculo estável (dependendo do tipo de contrato), na Administração Pública, ultrapassado este período com sucesso, o trabalhador adquire vínculo definitivo, tornando-se funcionário público de forma plena.

Embora o período experimental tenha uma função semelhante nos dois regimes, o grau de formalismo, os deveres da entidade empregadora e as garantias do trabalhador são substancialmente mais exigentes na função pública, refletindo o enquadramento legal próprio da Administração e a sua sujeição a princípios constitucionais e administrativos.

Concluindo, o período experimental na função pública portuguesa, embora preveja certa flexibilidade para a cessação da relação laboral, está longe de ser uma “zona franca” isenta de controlo legal. A proteção do trabalhador e os princípios da Administração Pública impõem exigências de motivação, proporcionalidade e justiça material. Trata-se, assim, de um instituto que deve ser gerido com equilíbrio entre os interesses da Administração e os direitos dos trabalhadores.

Leonor Frazão Grego

Partilhar