O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), no acórdão de 4 de outubro de 2024, analisou o conceito de “remuneração” e a proibição de discriminação indireta com base no género, à luz dos artigos n.º 2, alínea e), e n.º 4 da Diretiva 2006/54/CE, no contexto dos tripulantes de cabina e dos pilotos de uma companhia aérea.
Neste caso, o pedido de decisão prejudicial refere-se a vários artigos da Diretiva 2006/54/CE, que regula a igualdade de oportunidades e igualdade de género no âmbito do emprego. A alegação de discriminação indireta apresentada por um Sindicato, baseou-se na disparidade que há nas ajudas de custo pagas a tripulantes de cabina, na sua maioria mulheres, e a pilotos, um grupo maioritariamente constituído por homens, alegando que as ajudas de custo atribuídas às mulheres são inferiores, o que configura uma violação do princípio da igualdade.
O sindicato argumentou que a diferença de valores atribuídos para ajudas de custo entre os dois grupos constituía discriminação indireta, proibida pelo artigo n.º 14 da Diretiva, defendendo que as ajudas de custo pagas às tripulantes de cabina são fixadas em montante inferior em relação ao montante pago aos pilotos,apesar de ambos os grupos terem despesas similares nas deslocações profissionais.
A interpretação da Diretiva, especificamente do conceito de “remuneração”, revelou-se central para o TJUE. O tribunalclarificou que a definição, engloba não apenas o salário base, mas também qualquer outra compensação paga pelo empregador ao trabalhador pelo exercício do trabalho, incluindo ajudas de custo. Assim, concluiu-se que as ajudas de custo discutidas fazem parte da remuneração, dado serem pagas para compensar despesas diretamente relacionadas com o trabalho dos empregados.
Adicionalmente, interpretou-se o artigo n.º 4 da Diretiva 2006/54/CE, que proíbe a discriminação em matéria de remuneração entre homens e mulheres desde que a disparidade se verifique para um “mesmo trabalho” ou “trabalho de igual valor”. Assim, o TJUE observou que as funções desempenhadas por pilotos e tripulantes de cabina não são de igual valor, nem comparáveis, devido à natureza das funções e as exigências de formação. Assim, o Tribunal concluiu que a discrepância no valor das ajudas de custo não configura violação da Diretiva, uma vez que as funções não são consideradas equivalentes. Dada a clara distinção entre o trabalho dos pilotos e dos tripulantes de cabina, o Tribunal entendeu que a diferença não representa discriminação indireta. Logo, as ajudas de custo concedidas pela companhia aérea não violam o princípio da igualdade de tratamento da Diretiva 2006/54/CE.
O TJUE em resposta à questão submetida sobre a interpretação do n.º 1, aliena e) artigo n.º 2.° e o artigo n.º 4 da Diretiva 2006/54, considerou que: “ devem ser interpretados os conceitos no sentido de que, por um lado, as ajudas de custo que compensam, de acordo com um montante fixo, certas despesas efetuadas pelos trabalhadores por força das suas deslocações profissionais constituem um elemento da sua remuneração e, por outro, uma diferença relativa ao montante dessas ajudas de custo consoante sejam concedidas a um grupo de trabalhadores composto maioritariamente por homens ou a um grupo de trabalhadores composto maioritariamente por mulheres não é proibida por esta diretiva quando estes dois grupos de trabalhadores não exercem um mesmo trabalho ou um trabalho ao qual é atribuído um valor igual.”
Carolina Fernandes @ DCM | Littler