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(Im)penhorabilidade da indemnização por cessação do contrato de trabalho: que limites?

A gestão de orçamentos é sempre uma temática desafiante, podendo ocorrer casos em que uma gestão menos criteriosa pode gerar imprevistos. Independentemente da razão que motiva a aplicação desta medida, é frequente a existência de trabalhadores sujeitos à penhora de vencimento devido à incapacidade de liquidar as suas dívidas.

A penhora de vencimento consiste na apreensão judicial do vencimento do executado (devedor) para a satisfação do direito de crédito do exequente (credor).

Esta penhora de vencimento do devedor tanto pode ser promovida no âmbito de uma ação executiva intentada por um credor privado, como também no âmbito de um processo de execução fiscal por dívidas às Finanças, à Segurança Social ou a outro órgão do Estado.

No entanto, há que ter em conta que o vencimento não é um bem totalmente penhorável. A lei impõe limites com o objetivo de evitar excessos aquando do momento da cobrança coerciva de determinada dívida. Em regra, não se pode penhorar mais de um terço do ordenado do devedor, de forma a ficar salvaguardada a subsistência do devedor e do seu agregado familiar – cfr. artigo 738.º, do Código do Processo Civil (doravante CPC).

Esta norma abrange não só o vencimento, mas também salários, prestações periódicas pagas a título de aposentação ou de qualquer outra regalia social, seguro, indemnização por acidente, renda vitalícia ou prestações de qualquer natureza que assegurem a subsistência do executado

E as indemnizações advenientes da cessação da relação de trabalho, não sendo vencimento, são livremente penhoráveis?

O Supremo Tribunal de Justiça debruçou-se em decisão recente sobre esse tema, sufragando entendimento segundo o qual a indemnização atribuída ao trabalhador ilicitamente despedido, em substituição da reintegração, é parcialmente impenhorável, nos termos do artigo 738.º, n.º 1 do CPC.

A norma do artigo 738.º do CPC é interpretada como uma “cláusula aberta”, abrangendo prestações de qualquer natureza que assegurem a subsistência do executado. Estabelece este preceito que dois terços da parte líquida dos vencimentos, salários, e outras prestações que assegurem a subsistência do executado são impenhoráveis.

Considerou o Colendo Tribunal que a indemnização por despedimento ilícito, embora não consubstancie salário, é calculada com base no salário do trabalhador e visa assegurar a subsistência do trabalhador durante algum tempo.

O Acórdão é de Uniformização de Jurisprudência o que significa que consolida uma interpretação do artigo 738.º do CPC, trazendo maior segurança jurídica e previsibilidade para casos futuros.

Em termos sumários, a decisão do Supremo Tribunal de Justiça considerou que a impenhorabilidade é a solução que melhor se coaduna com a proteção especialmente conferida à indemnização no concurso dos credores (não se compreenderia que fosse integralmente penhorável por credores comuns um crédito que prevalece sobre garantia reais qualificadas como a hipoteca ou o direito de retenção) e com o benefício de isenção de IRS que é reconhecido pelo art. 2.º, n.º 4 do CIRS (ou seja, se o sistema tributário protege este crédito, é coerente impor um nível de proteção equivalente no contexto processual civil).

Finalmente, o Acórdão defende que a solução da impenhorabilidade tenderia a condicionar indevidamente o exercício de opção entre a indemnização e a reintegração (o trabalhador evitará a indemnização se puder antecipar que a mesma é integralmente penhorável, o que não sucede com os salários a auferir no caso da reintegração).

Nuno Abranches Pinto | Gonçalo Asper Caro

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