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Pacto de Permanência: Liberdade de Trabalho e Investimento Empresarial

A liberdade de trabalho, enquanto direito fundamental consagrado na Constituição da República Portuguesa, representa um dos pilares do Estado de direito democrático.

Contudo, o seu exercício não é absoluto, podendo ser objeto de restrições legalmente admissíveis, desde que respeitados os princípios da legalidade, necessidade, adequação e proporcionalidade.

Neste contexto, o pacto de permanência previsto no artigo 137.º do Código do Trabalho, surge como uma figura jurídica que permite a entidade empregadora salvaguardar o investimento realizado na formação profissional do trabalhador, mediante a sua vinculação contratual por um período determinado.

A admissibilidade do pacto de permanência decorre da necessidade de conciliar o direito à liberdade de trabalho com a tutela dos interesses legítimos da entidade empregadora, nomeadamente quando esta incorre em despesas avultadas com a formação profissional do trabalhador.

Trata-se de uma limitação pontual e condicionada, que deve respeitar os princípios da legalidade, necessidade, adequação e proporcionalidade, nos termos do artigo 18.º da Constituição da República portuguesa.

O n.º 1 do artigo 137.º do Código do Trabalho estabelece que:

“As partes podem convencionar que o trabalhador se obriga a não denunciar o contrato de trabalho, por um período não superior a três anos, como compensação ao empregador por despesas avultadas feitas com a sua formação profissional.”

Este dispositivo consagra uma norma de natureza imperativa, sendo inválido qualquer pacto que exceda o limite temporal de três anos, nos termos do artigo 121.º, n.º 2 do mesmo diploma.

Mas o que são “Despesas Avultadas”?

A expressão “despesas avultadas” constitui um conceito jurídico indeterminado, cuja concretização depende de uma análise casuística. A jurisprudência, nomeadamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26 de junho de 2019 (proc. n.º 2051/18.0T8VFX.L1-4), tem defendido que a sua definição deve atender:

  • Ao custo efetivo da formação;
  • À capacidade económico-financeira da entidade empregadora;
  • Ao impacto da despesa no contexto empresarial.

O n.º 2 do artigo 137.º prevê que o trabalhador pode desvincular-se do pacto mediante o pagamento das despesas referidas. A lei, porém, é omissa quanto ao cálculo proporcional desse montante em função do tempo já cumprido.

A doutrina, tem recorrido ao artigo 81.º, n.º 2 do Código Civil, que regula a revogação de restrições voluntárias aos direitos de personalidade, para sustentar que o valor a pagar deve ser proporcional ao tempo em falta.

Esta interpretação visa proteger as legítimas expectativas da entidade empregadora, sem desconsiderar o exercício legítimo da liberdade de trabalho por parte do trabalhador.

Para as empresas que investem na formação dos seus colaboradores, o pacto de permanência constitui um instrumento jurídico relevante para proteger esse investimento. A sua validade, contudo, depende do cumprimento rigoroso de três requisitos legais:

  • Existência de despesas avultadas com formação profissional;
  • Limitação temporal máxima de três anos;
  • Possibilidade de cessação antecipada mediante compensação proporcional.

A aplicação deste mecanismo exige prudência e fundamentação jurídica sólida, sob pena de se configurar uma restrição desproporcionada ao exercício da liberdade de trabalho, que é um direito constitucionalmente protegido.

Em última análise, o pacto de permanência deve ser encarado pelas empresas como uma ferramenta de equilíbrio: permite garantir retorno sobre o investimento realizado na qualificação dos trabalhadores, sem comprometer os direitos fundamentais dos trabalhadores. A sua utilização deve ser cuidadosamente estruturada, com cláusulas claras, proporcionais e juridicamente sustentáveis.

Joana Azenha

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