No último mês, foram publicadas múltiplas notícias nos mais variados órgãos de comunicação social, relativamente a um Diretor, de um dos principais estabelecimentos comerciais do país, que terá sido despedido com justa causa em virtude de, alegadamente, ter adotado condutas suscetíveis de consubstanciarem assédio sexual sob uma trabalhadora, sua inferior hierárquica.
Este caso de assédio sexual não é, infelizmente, um caso isolado. É, na verdade, um espelho de uma cultura de abuso que se verifica em muitos locais de trabalho.
Concretamente, em janeiro de 2023, um diretor de loja de um estabelecimento comercial acusado de apalpar uma trabalhadora enquanto esta trabalhava na cozinha, chamando-a ainda de “coisa boa“.
Recentemente tivemos acesso ao Acórdão em questão, do Tribunal da Relação de Évora, o qual nos propomos a analisar no presente artigo.
O caso em apreço teve como fundamento o comportamento de um Trabalhador, com categoria profissional de Diretor de Loja, que se dirigiu à trabalhadora, dando-lhe uma “palmada no rabo”, apalpando-a, e dizendo “coisa boa”. Posto isto, a Empregadora apresentou articulado motivador de despedimento, do qual constam estes factos e considerando que a conduta descrita tornou impossível a subsistência da relação de trabalho, e daí o despedimento com justa causa.
Tendo o Trabalhador impugnado o despedimento, veio a primeira instância dar razão à Empregadora, decisão perante a qual o Trabalhador interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, que, mais uma vez, veio confirmar a justa causa de despedimento, e, por conseguinte, a ilicitude do mesmo.
Dos fundamentos utilizados para sustentar tal decisão, destacamos os seguintes:
“Verifica-se a impossibilidade prática e imediata de subsistência de relação laboral quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, suscetível de criar no espírito da primeira duvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral”
Utilizando este argumento, vem o Tribunal concluir que o descrito circunstancialismo fático representa um comportamento “humilhante, vexatório e atentatório da dignidade” da Trabalhadora, consubstanciando-se numa violação dos deveres de urbanidade e probidade, fazendo com que aquela se sentisse ”sexualmente constrangida”.
Foram ainda chamados à colação (i) o facto de estes comportamentos poderem ter repercussões na Empregadora, nomeadamente em termos reputacionais e de bom nome, em especial devido à localidade onde ocorreram os factos ser um meio relativamente pequeno, pelo que a velocidade de propagação de informação é maior e (ii) o exemplo que deveria ser dado pelo Trabalhador, tendo este um cargo de maior responsabilidade face à sua colega, concorrendo, também, para o aumento da gravidade da conduta.
Assim, o TRE conclui pela confirmação da decisão do Tribunal da 1ª instância, ficando a jurisprudência mais rica com uma decisão que condena um Trabalhador que adota condutas que, jamais, devem passar impunes. Desta forma, ao contrário da decisão analisada num dos nossos artigos mais recentes, consideramos que o TRE estabeleceu um importante precedente para decisões futuras, vindo demonstrar a seriedade e sensibilidade que este tema requer.
É imperativo que as empresas compreendam que tolerar tais atos não só prejudica as vítimas, como também afeta negativamente toda a organização, comprometendo a produtividade e a sua reputação.
Acreditamos que o presente caso e deve servir como um ponto de viragem e de alerta para outras organizações, que são cada vez mais pressionadas a implementar políticas de tolerância zero em relação ao assédio sexual no local de trabalho.
Estaremos atentos a desenvolvimentos futuros.
Filipa Bilé Grilo | Joana Azenha @ DCM | Littler