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Novo entendimento da Autoridade Tributária quanto às ajudas de custo poderá alterar a prática das empresas?

By 26 Abril, 2023No Comments

Em Novembro de 2022, a Autoridade Tributária (AT) pronunciou-se no âmbito de um pedido de informação vinculativa sobre a atribuição do subsídio de transporte a trabalhadores relativamente a deslocações em viatura própria ao serviço da empresa, que apenas foi disponibilizada no Portal da Autoridade Tributária no passado mês de Março.

No âmbito de tal pedido de informação vinculativa, a AT esclareceu que o valor de subsídio de transporte pago aos trabalhadores por deslocação em viatura própria ao serviço da empresa tem isenção fiscal até ao limite de 0,36€/quilómetro, mas que dentro deste valor se incluem igualmente as despesas dos trabalhadores com portagens e estacionamento, que normalmente eram consideradas pelas empresas como despesas à parte. Assim, todos os montantes que sejam pagos aos trabalhadores a título de subsídio de transporte que pressuponham a utilização e desgaste do veículo, combustível, portagens e estacionamento, serão objeto de tributação em sede de IRS se excederem o valor 0,36€/km.

Em primeiro lugar, parece-nos que será de analisar o caminho legislativo que levou à estipulação do valor de 0,36 €/km, que é isento de tributação por força do art. 2º, n.º 3 alínea d) do Código do Imposto sobre Rendimento de Pessoas Singulares.

Estabelece tal artigo do CIRS que são considerados como rendimentos de trabalho dependente “(…) d) As ajudas de custo e as importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da entidade patronal, na parte em que ambas excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado e as verbas para despesas de deslocação, viagens ou representação de que não tenham sido prestadas contas até ao termo do exercício; (…)”

Ora, considerando que inexiste estipulação legal para o sector privado quanto ao valor a atribuir aos trabalhadores pela utilização de veículo pessoal ao serviço da entidade empregadora, tem sido aplicado o regime da função pública como limite legal para a isenção de fiscal.

Aqui chegados, teremos de analisar o regime legal da função pública quanto ao valor devido aos trabalhadores pela utilização da sua viatura pessoal no âmbito profissional, que foi estabelecido na Portaria n.º 1553-D/2008, de 31 de dezembro.

A referida Portaria estabelecia que o subsídio de transporte a pagar aos trabalhadores pelo transporte em automóvel próprio era de 0,40 €/km, a partir de 01 de janeiro de 2009.

 Em Dezembro de 2010 foram aprovadas um conjunto de medidas adicionais de redução de despesa com vista à consolidação orçamental prevista no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) para 2010-2013, ao abrigo das quais foi estipulada a redução de 10% dos quantitativos de subsídio de transporte.

E assim, chegou-se ao valor atualmente em vigor para a função pública (e que tem sido utilizado para os limites da isenção fiscal no sector privado) de 0,36€/km.

Considerando que inexiste uma alteração a tal valor há mais de 12 anos, poderá questionar-se se com esta interpretação da AT de inclusão no valor de 0,36 € das portagens e estacionamento, no fundo apenas estará isento parte do custo despendido pelo trabalhador em deslocações em viatura própria e se estará a tributar a devolução de despesas efetivamente incorridas pelo trabalhador ao utilizar a sua viatura privada para deslocações profissionais.

Neste sentido poderá existir algum desincentivo à utilização por parte dos trabalhadores da sua própria viatura ao serviço da entidade empregadora por considerar que as condições em que foi estipulado o valor de 0,36€/km foram ultrapassadas pela realidade de 12 anos e que com a tributação do valor em excesso em caso de portagens e estacionamento estará no fundo a ser prejudicado.

Esta interpretação poderá causar alguma estranheza por parte das empresas cuja prática tem sido diversa, no entanto cumpre salientar que as informações vinculativas apenas vinculam a Autoridade Tributária perante o sujeito passivo (neste caso a empresa) que especificamente a requereu e têm uma validade de máxima de 4 anos (ou menos, caso exista uma alteração superveniente dos pressupostos de facto ou de direito).

Assim, apesar de, para as restantes empresas, a informação vinculativa não as vincular juridicamente a este seu entendimento, constitui uma bússola das orientações da AT que poderão ajudar as empresas no tratamento destas questões internamente. 

Filipa Lopes Galvão @ DCM | Littler